No estuário amazônico, a palmeira Mauritia flexuosa L. f. (miriti) é conhecida por fornecer matéria-prima para a confecção de cestaria e brinquedos, ambos de relevância econômica e cultural para a população local. Este estudo teve como objetivo realizar um levantamento a respeito da produção e comercialização dos dois principais artefatos - paneiros e brinquedos de miriti, no município de Abaetetuba, Pará. A pesquisa foi conduzida na comunidade ribeirinha de Cutininga e em duas associações de artesãos da sede municipal, por meio de entrevistas semiestruturadas e não estruturadas, envolvendo 18 informantes. Entre os produtos cesteiros comercializados, o paneiro é o único que conseguiu se manter no mercado e atualmente é a principal fonte de renda para os moradores da comunidade de Cutininga. Já a comercialização dos brinquedos de miriti vem ganhando maior expressividade a cada ano, com ápice de produção em outubro, durante a festividade do Círio de Nossa Senhora de Nazaré. Tanto os brinquedos como os paneiros atingiram escala comercial, sendo que o brinquedo é o produto feito da folha de Mauritia flexuosa L. f. de maior representatividade econômica no município. Porém, na região das ilhas, onde está situada Cutininga, constatou-se que o paneiro apresenta maior importância econômica.
Na atualidade, as sociedades tradicionais da Amazônia experimentam fortes mudanças com efeitos diretos sobre os sistemas agrícolas tradicionais, como a tendência à homogeneização de espécies e técnicas juntamente com uma dependência maior do mercado. Porém, as agriculturas amazônicas continuam diversificadas e valorizando a diversidade. O artigo descreve particularidades da agricultura Mebêngôkre-Kayapó a partir de uma metodologia elaborada com ferramentas da antropologia, da geografia e da etnobotânica em aldeias indígenas do sul do Pará. O manejo atual da agrobiodiversidade é analisado por meio da organização das roças no espaço e no tempo, e a partir de levantamentos realizados com foco na diversidade em nível de espécies e variedades de cultivos. Os resultados mostram que um grande número de plantas continua sendo cultivado e confirmam a vitalidade dos conhecimentos indígenas associados à agrobiodiversidade, mesmo em tempos de forte mudança. Os princípios de repartição, conservação, reprodução e fabricação da biodiversidade Mebêngôkre estão associados ao conceito de 'beleza' (mex), que valoriza, muito além de paisagens e técnicas agrícolas, o bom estado das redes sociais de trocas dentro e fora da aldeia, assim como valores essenciais dos Mebêngôkre.
Compreender as relações sociais que favorecem a ocorrência e a ampliação da diversidade biológica na região neotropical vem sendo uma das principais preocupações da etnobiologia. Este trabalho objetivou avaliar a riqueza de etnovariedades de mandioca cultivadas em comunidades situadas na área de floresta pública estadual denominada Gleba Nova Olinda I, Pará, Brasil. Os dados foram obtidos durante oficinas participativas com 46 informantes, os quais foram submetidos a análises qualitativas e quantitativas. No local, são conhecidas pelo menos 52 etnovariedades de mandioca, cujo compartilhamento de germoplasma ocorre de forma inter e intracomunitária. O acúmulo de conhecimento detido pelos comunitários sobre esse recurso agrobiológico revela o protagonismo da população na conservação biológica na região da Gleba Nova Olinda I. Desta maneira, é importante que o apoio ao desenvolvimento local esteja calcado na valorização do etnoconhecimento.
Medicinal plants continue to be appropriate and preferred alternatives for primary health care among rural Amazon populations, although their incorporation into conventional health services has been slow and challenging. Besides that, few Amazon plants have been considered in current public health policies. We sought here to better understand the role of medicinal plants in the therapeutic practices of residents of the Paulo Fonteles Land Settlement at Mosqueiro, a district within Belém (Pará State, Brazil) and identify species of potential value for government health services. Ethnobotanical data was obtained through semi-structured interviews with 61 residents. Results were analyzed using indices of use-report (Ur) and by consulting official documents of the Brazilian Ministry of Health (MS). The settlers use at least 61 exotic plants and 67 natives to Brazil; of the latter species, 21 were endemic to the Amazon region. The medicinal plants cited by the settlers were used for treating 76 symptoms and/or illnesses, especially related to digestive, respiratory, dermatological, and women's health problems; Anacardium occidentale, Alternanthera brasiliana, and Dalbergia monetaria had the highest URs. Forty plants are cited in MS documents. This research incentive more studies with Amazonian species and shows a list of 11 species for inclusion in health services offered to local populations. ; Las plantas medicinales siguen siendo una alternativa adecuada y preferida entre las poblaciones rurales amazónicas en la atención primaria de salud, sin embargo su incorporación a los servicios convencionales ha sido un desafío. Esta investigación buscó comprender el papel de las plantas medicinales en las prácticas terapéuticas de los habitantes del Asentamiento Paulo Fonteles, Mosqueiro, distrito de Belém (Pará), enfocándose en identificar especies potenciales a ser valoradas en los servicios oficiales de salud. Se obtuvieron datos etnobotánicos de 61 residentes mediante entrevistas semiestructuradas. Los resultados se analizaron mediante el índice "use-reports (UR)" y consultas a documentos oficiales del Ministerio de Salud. Los pobladores utilizan al menos 61 plantas exóticas, 67 nativas de Brasil, 21 de las cuales están restringidas a la Amazonía. Estas plantas combaten 76 síntomas y/o enfermedades, en especial los problemas digestivos, respiratorios, dermatológicos y femeninos para los cuales Anacardium occidentale, Alternanthera brasiliana y Dalbergia monetaria presentaron mayor UR, respectivamente. Entre las especies mencionadas, 40 se enumeran en documentos de MS. Esta investigación fomenta más estudios con especies amazónicas y presenta una lista de 11 especies para su inclusión en los servicios de salud que se ofrecen a las poblaciones locales. ; As plantas medicinais continuam sendo uma alternativa apropriada e preferencial entre as populações rurais amazônicas na assistência primária à saúde, contudo a sua incorporação aos serviços convencionais tem sido um desafio. Nesta pesquisa buscou-se entender o papel das plantas medicinais nas práticas terapêuticas dos moradores do Assentamento Paulo Fonteles, Mosqueiro, distrito de Belém (Pará), preocupando-se em identificar espécies potenciais a serem valorizadas nos serviços oficiais de saúde. Os dados etnobotânicos foram obtidos junto a 61 moradores por meio entrevistas semiestruturadas. Os resultados foram analisados utilizando o índice use-reports e consultas a documentos oficiais do Ministério da Saúde. Os assentados, utilizam pelo menos 61 plantas exóticas, 67 nativas do Brasil, 21 destas restritas à Amazônia. Estas plantas combatem 76 sintomas e/ou doenças, sobretudo problemas digestivos, respiratórios, dermatológicos e feminino para os quais Anacardium occidentale, Alternanthera brasiliana e Dalbergia monetaria apresentaram maior UR, respectivamente. Dentre as espécies citadas, 40 constam em documentos do MS. Esta pesquisa incentiva mais estudos com espécies amazônicas e apresenta uma lista de 11 espécies para inclusão nos serviços de saúde oferecidos às populações locais.
Resumo Este artigo aborda o processo de implementação de acervos etnobotânicos no Brasil, com enfoque nas coleções da Amazônia brasileira e sua importância frente às metas da Estratégia Global para a Conservação de Plantas (GSPC) no país.Foram identificadas quatro recentes coleções etnobotânicas no Brasil: duas encontram-se no Sudeste – no Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) e no Jardim Botânico da Fundação Zoobotânica de Minas Gerais (JBFZB-BH), – e duas no estadodo Pará – no Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e na Universidade do Estado do Pará (UEPA) –, reunindo mais de mil e quinhentas amostras, distribuídas em diferentes categorias de uso, com destaque para a medicinal. Estas coleçõesrefletem a importância da flora dos biomas Mata Atlântica, Cerrado e Amazônia em diversos contextos socioculturais e estão relacionadas às atividades voltadas a atingir pelo menos três das metas delineadas pela GSPC. Portanto, acervosdessa natureza devem ser encorajados e apoiados, dado o seu inestimável valor científico e cultural.
Resumo Para muitos povos indígenas da Amazônia, a comercialização de objetos da sua cultura material se apresenta como uma importante possibilidade de geração de renda. Especialistas na arte e muitas famílias das aldeias dedicam parte do seu tempo a elaborar objetos especificamente para este fim. São diversas as práticas e os significados envolvidos na produção e no intercâmbio (monetário ou não) desses objetos. Ao mesmo tempo, são constantes as demandas de articulação ao mercado em nível regional e nacional, encontrando-se ainda muitas dificuldades para abrir espaço à produção artesanal indígena. Considerando os contextos etnográficos dos povos indígenas Ka'apor (Terra Indígena Alto Turiaçú, Maranhão) e Mebêngôkre-Kayapó (Terras Indígenas Las Casas e Kayapó, Pará), discutem-se os processos de produção, intercâmbio e comercialização de objetos indígenas e a relação com a lógica do mercado. Examinam-se também as interpretações e os posicionamentos indígenas sobre esses aspectos e os possíveis efeitos dos aspectos jurídicos que se propõem a revalorizar e proteger os conhecimentos e o patrimônio indígena e o meio ambiente provedor das matérias-primas, considerando os impactos sobre as próprias iniciativas indígenas no momento de se inserir nos mercados.
Uncaria tomentosa e U. guianensis, conhecidas popularmente por 'unha de gato', são lianas amplamente comercializadas, cuja ação anti-inflamatória justifica-as como objeto de pesquisas farmacognósticas. Este estudo buscou caracterizar a anatomia foliar dessas duas espécies de Uncaria, a fim de estabelecer parâmetros de distinção entre as mesmas, de modo que os dados obtidos possam ser utilizados como referência em exames de controle de qualidade de amostras de fármacos, com vistas a verificar a autenticidade botânica. Amostras foram coletadas no horto de plantas medicinais da Universidade Federal Rural da Amazônia e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Amazônia Oriental, Belém, Pará, e analisadas segundo técnicas usuais em anatomia vegetal. Ambas as espécies possuem estômatos paracíticos e tricomas tectores apenas na face abaxial. O mesofilo é dorsiventral, com clorênquima paliçádico biestratificado em U. guianensis, e uniestratificado, com células subjacentes do clorênquima esponjoso tendendo a paliçádica, em U. tomentosa. A nervura central é biconvexa e o sistema vascular distingue as duas espécies. O pecíolo apresentou proeminências na face adaxial e feixe vascular colateral. Em todas as secções, foi possível notar a presença de idioblastos secretores. Portanto, essas espécies apresentam caracteres anatômicos peculiares, que podem ser utilizados para a distinção de suas respectivas drogas vegetais.