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Nas visitas realizadas por estudantes e pesquisadores à biblioteca do CEM observa-se nitidamente como o foco de atenção volta-se, como se diz na gíria, "à bola da vez" no que concerne aos movimentos migratórios em nosso país. Na década de 1980 e começo dos anos 1990, a moda era estudar a migração dos nordestinos, seguida pelos deslocamentos em direção à fronteira agrícola, entre os quais mereceu destaque o dos brasiguaios. Repentinamente, como num cerrar e abrir de cortinas, no palco da academia despontaram estudos voltados para a emigração dos brasileiros e, paralelamente, com todo fôlego, ao concomitante processo inverso – o da imigração – particularmente dos bolivianos inseridos no ramo das confecções e, em menor grau, aos refugiados e/ou solicitantes de refúgio. Atualmente, quase desnecessário dizê-lo, pesquisar a imigração haitiana tornouse a coqueluche da vez.

Esta apresentação está sendo escrita no rescaldo da vinda, a partir de meados do mês de abril de 2014, de algumas centenas de haitianos (e em menor número de nacionalidades outras) de Brasileia/Acre à cidade de São Paulo, mais precisamente para as dependências da Missão Paz, onde atuam os scalabrinianos, e que também é sede da revista Travessia. Estivemos, portanto, envolvidos com toda a mobilização que este fato gerou, primeiramente da parte de toda a grande equipe dos que aqui atuamos diuturnamente, bem como da parte da mídia, do poder público e da sociedade civil em geral. Para além dos que chegam rotineiramente à Missão, outros do Acre virão.

Este número da Travessia apresenta textos que percorrem variadas trilhas geográficas (Brasil, Itália, França, Argentina); perpassam distintos tempos (ontem e hoje, velhas e novas andanças) e se pautam por olhares plurais (integração, identidade, racismo, pastoral). [...]

O tema das migrações atrai os mais diversos olhares, as mais diferentes análises, ações e reações. Há ângulos dessa realidade que pautam, cotidianamente, governos, imprensa, ONGs, estudiosos; outros, para virem à tona, aguardam o olhar paciente do investigador. Travessia brinda o leitor com ambos. [...]

Após um ano de gestação, em meio de 1988, sob a responsabilidade do conselho editorial- composto por pesquisadores de diferentes áreas comprometidos com a causa dos migrantes - o CEM lançou uma nova publicação. Nova e inovadora: porque aberta à pluralidade de enfoques, porque voltada à socialização da produção acadêmica, porque gerida democraticamente, ao mesmo tempo, engajada nos movimentos sociais.

Na mira da viagem encetada, como mola propulsora, a miragem dos ganhos; no rastro, como condição inerente ao ato de migrar, as perdas e ausências.[...]

A temática proposta para este número despertou interesse não apenas por parte de pesquisadores da área das ciências socias, mas também de agentes da Pastoral. Diga-se, aliás, que entre os leitores da Travessia, um número significativo é composto por pessoas ligadas, particularmente, à Pastoral dos migrantes. Outrossim, a palavra "acolhida" talvez seja uma das mais caras e recorrentes entre os que, no âmbito das pastorais da igreja Católica, atuam junto aos migrantes.

Em seu número 21, (janeiro-abril/95), Travessia divulgava os resultados dos primeiros estudos referentes aos brasileiros no exterior, fato novo e recente de nossa história, irrompido a partir de meados da década de 1980. Seu volume, visto daqui, surpreendia, porém, a partir da ótica do destino, tratava-se ainda de uma "minoria invisível", para a qual, no horizonte da maioria, delineava-se o retomo. [...]

Ao falar do espaço, o geógrafo Milton Santos chamava a atenção para a grande variedade de acepções que a palavra envolve - um dos termos com mais verbetes. Não consta, porém, nos dicionários, "espaço-migrante", embora na acepção de muitos, poder-se-ia dizer que o mesmo já se tornou sinônimo de gueto. E nessa elasticidade conceituai, mas não por ela mesma, imputa-se ao espaço conotações que de fato perpassam os conflitos inerentes ao todo da organização social. E no caso específico dos migrantes, que não ocupam qualquer espaço, mas apenas aquele que lhes resta, este adquire conotação étnico-cultural. Tanto aqui, quanto lá fora, é forte a tendência em remarcar a distinção entre migrantes e autóctones, os nativos e os de fora. [...]

A revista TRAVESSIA, em seus dezoito anos de existência, manteve seu olhar sempre voltado para a razão de ser de quem a mantém - o migrante! Neste ano de 2005, quando a Congregação dos Missionários de São Carlos/Escalabrinianos celebra o Centenário da morte de seu fundador, o bem-aventurado João Batista Scalabrini, abre seu espaço para um olhar ad intra, sem, porém, descuidar do foco. Não se trata de um balanço retrospectivo, nem seria possível fazê-lo aqui, mas apenas de alguns flashes do legado de Scalabrini no Brasil, entrecruzando o migrante e o olhar da pastoral.

Ao manusear páginas, sejam as velhas conhecidas de papel que compiladas nas gráficas se nos oferecem em forma de livros, revistas, jornais, ou as que hoje, através de um simples e suave movimento de mão, velozmente deslizam ante nossos olhos na tela do computador, buscamos sempre, pacienciosa ou avidamente, a novidade, um furo de reportagem, uma temática inédita ou, para o revés desta, um novo ângulo de abordagem. Ao estamparmos a chamada "Preconceitos" nos distanciamos enormemente de qualquer ineditismo, é verdade, porém nos aproximamos de uma persistente atualidade. E talvez, mais do que isso, abrimos espaço para um mergulho nas intrincadas teias do nosso tecido social. [...]

Um mesmo personagem perfilado diante de duas lentes, ou seja, o migrante visto a partir de duas lógicas de abordagem é o que, grosso modo, oferecem os textos presentes neste número. De um lado, o enfoque da literatura, de outro, o da imprensa. Tecendo como que uma espécie de caricatura entre os dois olhares, poderiamos dizer que a literatura aproxima-se do migrante comandada pelo livre ato de criar e, através do manuseio prazeroso e criativo da palavra explicita os interstícios da complexa trama social, bem como as dimensões da subjetividade humana É o palpitar da vida que, em última dinstância, comanda apena do literato. A imprensa, por sua vez, obedece a interesses de grupos, tem como uma de suas preocupações a venda (de anúncios, notícias e imagens). Seleciona a terminologia, direciona a informação e, no extremo, manipula.

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