Inundação sazonal é o fenômeno ecológico mais importante do Pantanal. A cada ano, grandes regiões do bioma mudam de hábitats aquáticos para terrestres e vice-versa. As cheias ocupam cerca de 80% do Pantanal. Em contraste, durante a estiagem, grande parte da área inundada seca, quando a água retorna para o leito dos rios ou evapora. O Pantanal é uma grande área continental inundável (147.574 km2 no Brasil), com partes menores tocando a Bolívia ao norte e o Paraguai ao sul. O complexo de níveis de inundação, nutrientes e biota forma um sistema dinâmico. A vegetação compreende 1.863 espécies de plantas fanerógamas que ocorrem no Pantanal e 3.400 que se distribuem na Bacia do Alto Paraguai, além de 250 espécies de plantas aquáticas. Essa complexa cobertura vegetal e a produtividade sazonal dão suporte ecológico para uma fauna diversa e abundante do Pantanal: 263 espécies de peixes, 41 de anfíbios, 113 de répteis (177 Para a Bacia), 463 de aves e 132 de mamíferos. Ocorrem muitas espécies ameaçadas de extinção como a onça Panthera onca Linnaeus, 1758. Aves aquáticas são excepcionalmente abundantes na estação seca. A análise das causas-raízes das ameaças ambientais à biodiversidade indica que 17% do Pantanal e 63% do Planalto do seu entorno sofreram perdas e modificações de hábitats naturais devido à pecuária e agricultura não sustentáveis, mineração, contaminação ambiental (incluindo contaminação por mercúrio, pesticidas e esgoto urbano), turismo não sustentável, fogo, mudanças no fluxo das nascentes de rios, erosão, ação de conservação deficiente, com ineficiente implementação da legislação ambiental. Sob o enfoque evolucionário, a biodiversidade do Pantanal parece estar bem adaptada à expansão e ao encolhimento sazonal dos hábitats naturais devido à inundação. Contudo, a perda e alteração de hábitats devido à conversão da vegetação natural pela ocupação humana, constituem uma ameaça real, com prejuízo para a biodiversidade. ____________________________________________________________________________________ ABSTRACT ; Seasonal flooding is the most important ecological phenomenon in the Pantanal. Every year many parts of the biome change from terrestrial into aquatic habitats and vice-versa. The degree of inundation creates a range of major habitats. Flooding occupies about 80% of the whole Pantanal. In contrast, during the dry season, most of the flooded areas stay dry, when the water returns to the river beds or evaporates. The Pantanal is a large continental savanna wetland (147,574 km2 in Brazil), touching Bolivia to the north and Paraguay to the south. The maze of fluctuating water levels, nutrients, and biota forms a dynamic ecosystem. The vegetation comprises 1,863 phanerogam plant species listed for the floodplain and 3,400 for the whole basin and 250 species of aquatic plants. The complex vegetation cover and seasonal productivity support a diverse and abundant fauna within the floodplain: 263 species of fish, 41 of amphibians, 113 of reptiles (177 for the basin), 463 of birds and 132 mammal species. Many endangered species occur, including jaguar (Panthera onca Linnaeus, 1758). Waterfowl are exceptionally abundant during the dry season. Analysis of the root causes of the threats to biodiversity indicated that deforestation (17% of the Pantanal and 63% of the surrounding uplands) with modification and loss of natural habitats due to cattle ranching, unsustainable agriculture, mining, environmental contamination (including mercury, pesticides, urban sewage), non organized tourism, fire, disturbances at the upstream region modifying hydrological flow, erosion, weak implementation and enforcement of legislation are the major issues to face conservation action and sustainable use. Under an evolutionary focus, local biodiversity seems to be well adapted to seasonal shrinking and expansion of natural habitats due to flooding. However, the conversion of natural vegetation due to human occupation is a real threat to biodiversity.
OBJETIVO: Caracterizar o perfil dos farmacêuticos responsáveis técnicos em drogarias e avaliar o conhecimento sobre alguns aspectos da legislação que rege o funcionamento de drogarias e da profissão. MÉTODOS: Com base em 175 drogarias de Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, foram selecionados, por meio de sorteio aleatório, 100 farmacêuticos responsáveis técnicos. A coleta de dados foi feita por meio de entrevista face a face, orientada por um questionário que avaliava conhecimentos e atitudes. O dados foram processados e analisados utilizando-se Epi Info e Stata e houve busca de associações entre variáveis dependentes e independentes, usando o teste do qui-quadrado de Pearson e o teste exato de Fisher. RESULTADOS: A maioria dos farmacêuticos eram mulheres (64%), entre 22 e 29 anos (47%), formadas há cerca de três anos, com habilitação na área industrial (36%) ou em análises clínicas (29%). O conhecimento dos farmacêuticos sobre a legislação sanitária foi avaliado como insuficiente para 28% deles, regular para 50% e bom para 22%. Observou-se baixo conhecimento sobre a exigência legal da permanência de farmacêuticos nas drogarias durante todo o horário de funcionamento, suas atribuições, venda de antibióticos e aplicação de penicilina. Constatou-se que a maioria tem dificuldades com a conceituação de medicamentos genéricos e similares. O baixo nível de conhecimento não se associou com nenhuma variável independente, mostrando que está generalizado, ou seja, presente entre farmacêuticos de várias faixas etárias, de ambos os sexos, independente do tempo de formado e instituição formadora, modalidade de formação entre outros. CONCLUSÕES: Concluiu-se que a formação na área de atenção farmacêutica de medicamentos, durante a graduação e, sobretudo, o estágio em farmácia e drogaria está deficiente. Faz-se necessária a divulgação de informações sobre a legislação sanitária para o pleno exercício da profissão, sem ameaças penais ou prejuízo da população. ; OBJECTIVE: To characterize the profile of pharmacists employed as technical supervisors in drugstores and evaluate their knowledge regarding certain aspects of the legislation controlling drugstores and the profession in general. METHODS: Based on 175 drugstores in the city of Ribeirão Preto, southeastern Brazil, 100 pharmacists/technical supervisors were randomly selected. Data collection was done by means of in-person interviews, and was guided by a questionnaire evaluating knowledge and attitudes. Data were processed and analyzed using Epi Info and Stata software. Associations were sought between dependent and independent variables using Pearson's chi-squared and Fisher's exact tests. RESULTS: Most pharmacists were women (64%), aged 22-29 years (47%), graduated approximately three years prior to data collection, trained to work in the pharmaceutical industry (36%) or in clinical analysis (29%). Pharmacist's knowledge of sanitary legislation was considered as insufficient for 28% of subjects, regular for 50%, and good for 22%. Low levels of knowledge were observed regarding the legal requirement for the presence of a pharmacist during the entire drugstore opening hours, pharmacists' attributions, sale of antibiotics, and penicillin administration. It was found that most professionals have difficulties handling the concepts of 'generic' and 'similar' drugs. Low level of knowledge was not associated with any of the independent variables, indicating that this is a generalized phenomenon, i.e., one present among pharmacists of all age groups and both sexes, irrespective of the time since graduation, institution attended, and modality of graduation, among others. CONCLUSIONS: We conclude that training in the field of drug pharmaceutical care, during undergraduate studies and, especially, during traineeship in pharmacies and drugstores is deficient. It is necessary to divulge information concerning sanitary legislation so that pharmacists may fully exert their profession, without risk of legal threats or hazard to the population.
Recent studies contradict the axiomatic assumption that CFC rules always lead to an effective increase in capital costs. Although the existence of correlative effects between the CFC rules and the artificial modulation of the investors' decision-making behavior is undeniable, the orientation of this behavior has demonstrated specific (and complex) parameters in the econometric analysis, to the extent that a conjunction of variables, harmonized with different standards of CFC rules, in its different parameters, were considered: a) from a behaviorist point of view, this ratifies the conclusion that the CFC anti-avoidance legislation is effectively combative to the artificial diversion of profits abroad; b) it further demonstrates the potential readjustment of multinational financial engineering to the new limiting tax-rate parameters in low-tax jurisdictions ("tax trigger"); and finally c) it reveals that distinct CFC rules can generate equally distinct results, influencing the economic-rational behavior of agents with varying modulations and perspectives. In a plexus of 56 countries, with a significant bias of legitimacy to the existence of anti-deferral CFC-type rules, it was concluded that these rules inhibit passive income deviation structures, without, on the other hand, having a significant negative influence on productive investments. Validation of these causal correlations were based on modifying temporal parameters and specific variables. ; Des études récentes contredisent l'hypothèse axiomatique selon laquelle les règles CFC («controlled foreign corporation rules») conduisent toujours à une augmentation effective des coûts du capital. Bien que indémontrable l'existence d'effets corrélatifs entre la législation anti-évasion CFC rules et la modulation artificielle du comportement de prise de décision des investisseurs, l'orientation de ce comportement a démontré des paramètres spécifiques (et complexes) dans l'analyse économétrique, à la mesure où des variables, harmonisées aux standards de différentes règles CFC, dans ses différents paramètres, furent considérées: a) d'un point de vue béhavioriste, cela ratifie la conclusion, dans le sens que cette législation est efficacement combative au détournement artificiel de profits à l'étranger; b) il en démontre encore la potentielle réadaptation de l'ingénierie financière des multinationales aux nouveaux paramètres d'imposition-limite, dans des juridictions à faible imposition («seuil de déclenchement fiscal»); et enfin c) il révèle que des règles CFC distinctes peuvent générer des résultats aussi distincts, influençant le comportement économico-rationnel des agents selon des modulations et des perspectives variées. Dans un plexus de 56 pays, avec un biais important de légitimation à l'existence de normes anti-détournement type CFC, il a été conclu que ces règles inhibent les structures de déviation de revenus passifs, sans avoir en contrepartie une influence négative significative dans les investissements productifs. La validation de ces corrélations causales s'est produite en modifiant les paramètres temporel et des variables spécifiques. ; Estudos recentes contradizem a assunção axiomática de que normas CFC sempre levam ao incremento efetivo dos custos de capital. Embora inafastável a existência de efeitos correlacionais entre normas CFC e a modulação artificial do comportamento decisório de investidores, a orientação deste comportamento assumiu parâmetros individualizados (e complexos) em análise econométrica, à medida que foram consideradas variáveis afinadas aos condicionantes existentes em distintas normas CFC, em suas múltiplas configurações: a) sob ponto de vista behaviorista, esta aferição ratifica a conclusão de que a legislação CFC é eficazmente combativa ao desvio artificial de lucros offshore; b) demonstra ainda, sem prejuízo, a potencialidade de multinacionais readaptarem suas tipologias de engenharia financeira aos novos parâmetros de alíquota-limite das jurisdições de baixa tributação ("curva de gatilho-tributário"); e por fim: c) permite constatar que regras CFC distintas poderão gerar resultados também distintos, influenciando o comportamento econômico-racional dos agentes conforme modulações e perspectivas variadas. Em um plexo de 56 jurisdições, com grande viés legitimador à existência de normas antielusão do tipo CFC, concluiu-se que tais normas inibem estruturas de alocação de rendas passivas, sem apresentar influência negativa significativa em investimentos econômico-produtivos. A validação destas correlações causais deu-se pela modificação dos parâmetros de tempo e de variáveis específicas.
This papers explores the economic implications of immigration in Chile and how this country has tolerated and assimilated this phenomenon in a paradigmatic way in the region, a situation that is divergent with the anachronistic legislation and legal framework on migration in that country. The aforementioned causes harmful effe cts that, beyond the economic bounty and unquestionable capacity of Chile to tolerate large migratory volumes, point to a dangerous precedent for public migration policy, especially in the case of Haitian immigrants, which is contradictory with humanitarian criteria present in international instruments to which Chile has adhered. In this context, the article demonstrates how the chances of working for the most vulnerable migrant groups, contrary to what is thought in the intemational arena, have decreased, in many cases, due to differences in the demographic characteristics of immigrants and factors linked to xenophobia, social discrimination, and discrimination in the labor market, among others. Finally, it is recommended to reevaluate and update the current legislation on migration in Chile, so that, without prejudice to its ability to assimilate migration, that country implements immigration policies that, in opposition to what the current Govemment of Chile is deploying, keep in tune with juridical and constitutional principies, local and intemational, that protect the migrant worker and his family. ; En este artículo se exploran las implicaciones económicas de la inmigración en Chile y cómo este país ha tolerado y asimilado dicho fenómeno de modo paradigmático en la región, situación que es divergente con la anacrónica legislación y marco jurídico sobre migración en ese país. Lo anterior, provoca efectos nocivos que, más allá de la bonaza económica e indiscutible capacidad de Chile para tolerar grandes volúmenes migratorios, señala un peligroso precedente de política pública de migración, muy especialmente en el casode los inmigrantes haitianos, que es contradictoria con criterios humanitarios presentes en instrumentos internacionales a los que Chile ha adherido. En este contexto, en el artículo se demuestra cómo las probabilidades de trabajo para los grupos migratorios más vulnerables, contrario a lo que es pensadoen el ámbito internacional, han descendido, en muchas ocasiones, debido a diferencias en las características demográficas de los inmigrantes y a factores ligados a la xenofobia, discriminación social, y discriminación del mercado laboral, entre otros. Finalmente, se recomienda reevaluar y actualizar la actual legislación sobre migración en Chile, para que, sin perjuicio de su habilidad de asimilación migratoria, ese país implemente políticas de inmigración que, en oposición a lo que el actual Gobierno de Chile está desplegando, guardensintonía con principios jurídicos y constitucionales, locales e internacionales, que protegen al trabajador migrante y su familia. ; Cet article explore les implications économiques de l'immigration au Chile et la maniere dont ce pays a toléré et assimilé ce phénomene de maniere paradigmatique dans la région, une situation qui s' écarte de la législation et du cadre juridique anachroniques sur la migration dans ce pays. Ce qui précede entraine des effe ts néfastes qui, au-dela de la prospérité économique et de la capacité incontestable du Chile a tolérer de grands volumes de migration, met en évidence un dangereux précédent de politique publique en matierede migration, en particulier dans le cas des immigrants ha'itiens, qui est en contradiction avec les criteres humanitaires présents dans les instruments intemationaux auxquels le Chile a adhéré. Dans ce contexte, l'article montre comment les chances de travailler pour les groupes migratoires les plus vulnérables, contrairement a ce que l'on pense dans la sphere intemationale, ont diminué, a de nombreuses reprises, en raison des diffé rences dans les caractéristiques démographiques des immigrants et de facteurs liés a laxénophobie, a la discrimination sociale et a la discrimination sur le marché du travail, entre autres. Enfin, il est recommandé de réévaluer et d'actualiser la législation actuelle en matiere de migration au Chili afin que ce pays puisse, sans préjudice de sa capacité d'assimilation des migrants, mettre en reuvre des politiques d'immigration qui, contrairement a ce que déploie l' actuel gouvemement chilien, soient conformes aux principes juridiques et constitutionnels locaux et intemationaux protégeant les travailleurs migrants et leurs familles. ; Este artigo explora as implicações económicas da imigração no Chile e como este país tem tolerado e assimilado este fenómeno de forma paradigmática na região, urna situação que diverge da legislação anacrónica e do marco legal sobre migração naquele país. A acima exposta causa efeitos nocivos que, além da bonança económica e da indiscutível capacidade do Chile de tolerar grandes volumes de migração, apontam para um perigoso precedente de políticas públicas sobre migração, especialmente no caso dos imigrantes haitianos, o que contradiz os critérios humanitários presentes nos instrumentos interacionais aos quais o Chile aderiu. Neste contexto, o artigo mostra como as possibilidades de trabalho para os grupos migratórios mais vulneráveis, ao contrário do que se pensa no âmbito internacional, diminuíram, em muitas ocasiões, devido as diferenças nas características demográficas dos imigrantes e a fatores ligados a xenofobia, discriminação social e discriminação no mercado de trabalho, entre outros. Por último, recomenda-se que a legislação migratória vigente no Chile seja reavaliada e atualizada para que, sem prejuízo de sua capacidade de assimilação de migrantes, esse país possa implementar políticas de imigração que, ao contrário do que o atual govemo chileno está implantando, estejam de acordo com os princípios legais e constitucionais locais e interacionais que protegem os trabalhadores migrantes e suas famílias.
Con la promulgación de la Ley 599 de 1999 se establecieron las bases del comercio electrónico y, otorgándole eficacia, validez y fuerza probatoria a los mensajes de datos, surgió la discusión de los títulos valores electrónicos bajo el principio de la equivalencia funcional; y si bien la anterior normativa permitió cumplir con los requisitos esenciales de los títulos valores en el escenario digital, la misma se tornó insuficiente para garantizar, bajo criterios de unicidad, la circulación de estos documentos cambiarios inmateriales.En la actualidad, atendiendo a los vacíos en la anterior normativa, ha tomado fuerza una propuesta legislativa que de manera expresa y especial pretende trasplantar a estos documentos inmateriales el método centralizado propio del mercado bursátil, exigiéndose que los títulos valores electrónicos sean custodiados y/o administrados por Depósitos Centralizado de Valores, quienes serán responsables de expedir un certificado para efectos del ejercicio de los derechos incorporados.Sin perjuicio de los beneficios que podrá reportar la anterior propuesta para la circulación de los títulos registrados en una base de datos centralizada, garantizándose también la trazabilidad de las operaciones y gravámenes sobre el documento inmaterial, se concluirá que lo anterior rompe con los principios esenciales de los títulos valores y se expondrán las consecuencias derivadas de ello.Pese al análisis dogmático contenido en el presente artículo, la conceptualización adecuada de los títulos inmateriales que se valgan del mecanismo centralizado expuesto será de gran importancia para efectos del establecimiento de una regulación más apropiada a sus características propias, siendo respetuosos del método científico que debe reinar en el Derecho. ; With the promulgation of Law 599 of 1999, the foundations of electronic commerce were established and, giving efficiency, validity and probative force to data messages, the discussion of electronic securities emerged under the principle of functional equivalence; and although the previous regulations allowed to comply with the essential requirements of securities in the digital scenario, it became insufficient to guarantee, under unique criteria, the circulation of these intangible exchange documents. Nowadays, in response to the gaps in the previous regulations, a legislative proposal that expressly and specially intends to transplant the centralized method of the stock market to these immaterial documents has been enforced, requiring that electronic securities be guarded and / or managed by centralized securities deposits, who will be responsible for issuing a certificate for the purposes of exercising the rights incorporated. Without prejudice to the benefits that the previous proposal for the circulation of the titles registered in a centralized database may report, also guaranteeing the traceability of the operations and encumbrances on the intangible document, it will be concluded that the above breaks with the essential principles of the securities and the consequences derived from it will be exposed. Despite the dogmatic analysis contained in this article, the adequate conceptualization of the intangible titles that use the centralized mechanism exposed will be of great importance for purposes of establishing a regulation more appropriate to their own characteristics, being respectful of the scientific method that should reign in law. ; Com a promulgação da Lei nº 599, de 1999, foram estabelecidas as bases do comércio eletrônico e, dando eficácia, validade e força probatória às mensagens de dados, a discussão dos títulos eletrônicos surgiu sob o princípio da equivalência funcional; e, embora a regulamentação anterior permitisse cumprir os requisitos essenciais dos títulos no cenário digital, tornou-se insuficiente para garantir, sob critérios de unicidade, a circulação desses documentos imateriais de troca. Actualmente, em resposta às lacunas da regulamentação anterior, entrou em vigor uma proposta legislativa que pretende expressamente e sobretudo transplantar para estes documentos intangíveis o método centralizado do mercado de valores mobiliários, exigindo que os valores mobiliários electrónicos sejam guardados e/ou administrados por Centrais de Valores Mobiliários, que serão responsáveis pela emissão de um certificado para efeitos do exercício dos direitos incorporados.Sem prejuízo dos benefícios que a proposta anterior possa trazer para a circulação de valores mobiliários registrados em banco de dados centralizado, garantindo também a rastreabilidade das operações e ônus sobre o documento intangível, conclui-se que serão explicitadas as rupturas com os princípios essenciais dos valores mobiliários e as conseqüências dele decorrentes.Apesar da análise dogmática contida neste artigo, a adequada conceituação dos títulos imateriais que fazem uso do mecanismo centralizado exposto, será de grande importância para os efeitos do estabelecimento de um regulamento mais adequado às suas próprias características, respeitando o método científico que deve reinar no Direito. ; Avec l'adoption de la loi 599 de 1999, les fondements du commerce électro-nique ont été établis et, en donnant efficacité, validité et force probante aux messages de données, la discussion sur les titres électroniques a émergé sous le principe de l'équivalence fonctionnelle ; et bien que la réglementation précédente ait permis de satisfaire aux exigences essentielles des titres dans le scénario numérique, elle est devenue insuffisante pour garantir, selon des critères de unicité, la circulation de ces documents immatériels.Actuellement, en réponse aux lacunes de la réglementation précédente, une proposition législative est entrée en vigueur qui vise expressément et surtout à transposer à ces documents immatériels la méthode centralisée du marché boursier, exigeant que les titres électroniques soient gardés et/ou administrés par des dépositaires centralisés de titres, qui seront chargés d'émettre un certificat aux fins de l'exercice des droits incorporés.Sans préjudice des avantages que la proposition précédente peut apporter pour la circulation des titres inscrits dans une base de données centralisée, garantissant également la traçabilité des opérations et des charges sur le document immatériel, il sera conclu que ce qui précède rompt avec les principes essentiels des titres et les conséquences qui en découlent sera expliqué.Malgré l'analyse dogmatique contenue dans cet article, la conceptualisation adéquate des titres immatériels qui utilisent le mécanisme centralisé exposé, sera d'une grande importance pour les effets de l'établissement d'une réglementation plus appropriée à ses propres caractéristiques, en respectant la méthode scientifique qui doit régner dans la Loi."
Tese de Doutoramento em Educação ; 1. PEQUENA ABERTURA Na presente tese tento fazer um corte epistémico/metodológico relativamente ao ensino da investigação, utilizando como eixo fundador uma atitude femomenológica. Trata-se de tentar pôr em situação e com intencionalidade os estudantes de licenciatura e pósgraduação na realização dos seus projectos de investigação. Para esse fim, a tese não se apresenta simplisticamente como uma proposta inédita a aplicar, mas antes, como diz Levinas «provou-se andando», isto é, toma como ponto de partida um texto em que se apresenta um modelo e perspectiva da investigação denominado "A complememtariedad Etnográfica" (o qual vem sendo aplicado desde o ano 1998 em diferentes projectos finais de licenciatura e mestrado e em teses de doutoramento) com a intenção de fazer uma análise do referido texto, vendo as suas fendas ou fissuras e, através da sua desconstrução, poder elaborar uma perspectiva didáctica para formar em investigação a partir da subjectividade. Em tal sentido, a tese apoia-se nas teorizações quer filosóficas da subjectividade, em autores como Levinas, quer epistémico/metodológicas, em autores como Zemelman, Gonzáles Rey e Maffesoli entre outros. Vislumbra-se nos resultados como uma proposta de investigação deve apoiar-se em processos criativos de configuração que permitam aos investigadores articular entre si as diversidades e verificar como estas emergem num tempo e num lugar, cruzados por uma subjectividade pessoal da qual é impossível prescindir. Deste modo, coloca-se o sujeito-investigador no meio do tema ou problema investigado afim de que venha a mover-se co-dependentemente com ele; graças a essa dependência, torna-se finalmente livre, pois assume-o como pertencendo-lhe… como morada sensível para decidir (Levinas, 1997). 2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO ESTUDO Estamos assistindo ao aparecimento de novos paradigmas epistemológicos para nos entendermos num mundo que nos aparece pequeno e supérfluo, difícil de compreender nos seus múltiplos relatos, nos seus imaginários de sentido, na própria vida que corre no meio da tecnologia, da exclusão, da pobreza, da opulência, da desigualdade e da academia. Qual é o papel que deve desempenhar a Universidade em tudo isto? Que compete à Educação Superior para além de administrar o conhecimento e parcelar os saberes em disciplinas que nos fazem ver as partes sem chegar a compreender o todo? A Universidade encontra-se actualmente no meio de tensões na medida em que deve cumprir com as demandas económicas do Estado e as exigências de equidade que lhe exige a sociedade. Isto deve fazer da Universidade como instituição académica (e dos seus membros como seres reflexivos) um lugar altamente crítico com os conhecimentos que se geram no seu interior, como o expressara Fuller (1997, 2003): actualmente a educação superior opera sobre a sociedade como «uma luva de veludo que esconde o punho de ferro da empresa académica», querendo assumir com isso que a Universidade se converteu numa instituição que oferece títulos e ministra um conhecimento hierarquizado e não faz a sua democratização. Na fase derradeira da sua vida, em 1996, Gadamer mostrava como o sentido parcelar do conhecimento cada vez se torna mais comum nas universidades: "Agora posso vê-lo muito claramente nas universidades. Aí temos turmas gigantescas às quais assistem centenas de estudantes. Nem o professor pode reconhecer o aluno dotado nem se podem reconhecer entre si os que o entendem. É uma canseira desesperante. Espero que algum dia a coisa mude. Vejo-o nos exemplos americanos e ingleses. (Ediçãode 2003: 26)". Encontramo-nos num mundo que está constantemente a transitar da era da informação à era do conhecimento, o que obriga as instituições a perguntarem-se sobre os ajustes que deverão sofrer os seus currículos. Já não podemos assegurar que aquilo para que se estuda seja precisamente aquilo em que se vai trabalhar. "Estamos diante de um desconcertante paradoxo: as empresas reclamam profissionais com projecto e iniciativa quando o que a sociedade produz no seu conjunto são indivíduos inseguros, cheios de incertezas e com fortes tendências para a depressão, o stress afectivo e mental. Até o próprioâmbito de trabalho está a deixar de ser um âmbito chave de comunicação,do reconhecimento social de si mesmo, e portanto de afirmação pessoal" (Barbero, 2004: 37). Os novos profissionais ingressam com a ilusão (o entusiasmo) de buscar um posto no mercado no meio da precariedade e da incerteza, muitas vezes voltam-se sobre si mesmos para encontrar na sua interioridade aquilo em que se sentem satisfeitos. Contudo, a triste realidade mostra-lhes que se situam laboralmente não naquilo que querem mas nas possibilidades que o mercado oferece. Frente a esta dualidade (vida institucional / singularidade do ser), torna-se imperativo fazer uma mudança curricular nos diferentes planos de estudo da Universidade. Para além de ter como eixo de acção uma formação baseada somente no conhecimento, o que temos, entre nós e connosco, é o ser em toda a sua expressão; um ser que encontra nas suas diferentes manifestações de vida a vitalidade e essência do que é e não só do que faz ou representa. Qual é a essência do ser senão a própria vida? Que são para mim as coisas senão aquilo a que realmente outorgo significado? Que é o que realmente nos desintoxica de um "dever ser" imposto de fora senão o "querer ser", o ir sendo com sentido? Somos arrojados para metáforas possíveis, para sonhos realizáveis, para projectos e sentidos de vida. Somos chamados a trabalhar em lugares e territórios com um significado para sujeitos que compartilham o seu saber e não vêm à Universidade apenas para receber conhecimento, sujeitos intencionais (isto é, abertos ao mundo) que, não só experimentam uma «razão objectiva», mas também processos constitutivos desta como a ética, a singularidade e a subjectividade. A Universidade não deve continuar a formar, ou melhor, a preparar estudantes só para um mercado competitivo. Como educadores-educandos, estamos convocados a dar-nos sentidos de expansão com o propósito de nos projectarmos com força em um mundo «global» que, por influência do capitalismo, se nos torna cada vez mais hermético. Portanto, as nossas práticas universitárias devem romper os círculos repetidos da academia no dar e receber informação; torna-se necessário entrar na pluridimensionalidade do ser a partir das suas distintas manifestações: física, mental, emocional, transcendente, cultural e inconsciente. Como educadores, temos de procurar que os estudantes elaborem os seus juízos sobre os conhecimentos adquiridos, que criem a sua própria concepção do mundo e que construam os seus imaginários no tipo de sociedade e cultura em que querem viver (Lipman, 1996). O que acabámos de afirmar exige de nós um compromisso social, um projectarmo-nos num mundo que pede coerência entre o que se investiga na Universidade e o que ela representa como opção de mudança e transformação nos seus contextos locais. "A irrupção dos pobres nos nossos povoados e cidades durante os últimos anos exige a conversão do ensino numa praxis de solidariedade onde o individual e o pessoal se situem sempre em relação com o colectivo e o comunitário" (MacLaren, 1997: 21); esta conversão é possível se pensarmos crítica e criativamente a partir das nossas aulas universitárias, investigando a partir da subjectividade dos e com os estudantes, a respeito de um mundo que nos pertence como morada e não como objecto dissecado de laboratório. Para Levinas, o subjectivo "não conserva o sentido de arbitrário, de passivo e de não universal. Inaugura a origem, o começo e – num sentido muito diferente do de causa ou de premissa – o principio" (1967: 166). Procurar conhecer por outras vias pode ao menos desestabilizar-nos da nossa acostumada maneira de aprender. 3. PROPÓSITOS E JUSTIFICAÇÃO DA ÁREA PROBLÉMICA O objecto do presente estudo enquadra-se no âmbito do Ensino da Investigação como uma possibilidade de ajuda a quem inicia o seu processo como investigador, oferecendo algumas pistas e itinerários para que possa transitar pelos caminhos escabrosos da investigação em ciências humanas e sociais. Com base na minha experiência como professor de investigação, fui observando que existem, até ao momento, poucos paradigmas metodológicos que ofereçam ao estudante, a partir da sua subjectividade, uma aproximação à investigação. Em muitos tratados expõem-se algumas sugestões, mas quase todas partem da interpretação de um conhecimento avançado na matéria por parte do sujeito aprendiz, sem considerarem, na maioria das situações, a orientação e o acompanhamento do estudante, desde o mais próximo e vivido no seu ambiente envolvente até ao mais complexo na investigação científica. Na raiz da proposta feita há oito anos em "La complementariedad etnográfica" (Murcia e Jaramillo, 2003) estabeleceram-se significativos avanços, na medida em que a perspectiva e desenho metodológico que tal proposta configura, sendo reconhecida como uma possibilidade para investigar em Ciências Humanas Sociais, permitiu o desenvolvimento de projectos de licenciatura (especificamente na área da saúde e da educação) e pós-graduação (mestrado e doutoramento). Não obstante, fui-me apercebendo de que o seu estatuto epistémico e metodológico se tinha sedimentado numa norma ou maneira de fazer investigação ao jeito da ciência normal proposta por Kuhn (Jaramillo e Aguirre, 2004). Nesta perspectiva, a presente tese aventura-se a elaborar uma proposta metodológica que chama a criação, entendida esta como o modo de operar ou fazer frente a algo (estratégia) e não como passos contidos num método específico; os elementos da proposta "são, na realidade, elementos de um sistema, mais que uma via que leve à sua descoberta" (Levinas, 1967: 164); por sua vez, o estudo converte-se numa maneira de partilhar com o leitor a experiência pessoal na realização de projectos de investigação com estudantes de licenciatura em distintas universidades colombianas. De igual modo, pretende-se coligir o contributo de reflexões fenomenológicas que sirvam de suporte para estabelecer uma fundamentação na formação em investigação através de processos de configuração-criadora, promovidos a partir da subjectividade do investigador e não alheios a ela. O contributo da presente investigação, inicialmente, é no campo das Ciências Humanas e Sociais; seguidamente, no campo da Educação, a qual nos acompanha desde o berço até à tumba. Com base no anteriormente referido, a pergunta eixo sobre a qual gira a presente tese é: "Existe uma possibilidade de investigar desde, para e com o sujeito investigador através de um processo de configuraçãocriadora?" 4. O CAMINHO PERCORRIDO: Des-construindo desde a des-sedimentação. A rota ou caminho do presente estudo situa-se nos elementos epistémicos e não só metodológicos da desconstrução, enquanto possibilidades de mobilizar o instituído pelo modelo d'A Complementariedad Etnografica. É assim que Derrida coloca a desconstrução no dizer, no acontecimento, na acção que o sujeito coloca à obra, ao constructo teorético que se erige como sedimentado sobre o seu conhecer. A desconstrução chega sem pedir autorização, aparece e incomoda o sujeito que começa a encarnar o sedimentado desta. "A desconstrução tem lugar; é um acontecimento que não espera a deliberação, a consciência ou a organização do sujeito, nem sequer da modernidade. Isso se desconstrói. O isso não é, aqui, uma coisa impessoal que se contraporia a alguma subjectividade egológica. Está em desconstrução (desconstruir-se… perder a suaconstrução). E no «se» do desconstruir-se, que não é a reflexividade de um eu ou de uma consciência, reside todo o enigma" (Derrida, 1997: 26). Em tal sentido, não se alude ao conceito de desconstrução como derrubamento, destruição, deslocação, demolição que deixa no seu caminho desolação e morte de uma obra construída para certas finalidades. Ao contrário, a positividade da desconstrução convida-nos a des-cobrir, des-mantelar, des-autorizar, as verdades absolutas de uma obra que no seu percurso se tornou esclerótica. "A Complementaridade Etnográfica" foi perdendo o seu carácter de nómada, de transeunte que ajuda a pôr o investigador em situação de incomodidade e in-contenção face ao seu projecto; pelo contrário, a proposta alude a certa suficiência, bem-estar, segurança de uns passos que pouco a pouco vão des-cobrindo uma estrutura que se esconde na realidade. O passo a passo indica por onde vai o caminho prefigurado de um asfalto claramente sinalizado que impede o engano e a criação de possibilidades em momentos chamados pré-configuração, configuração e reconfiguração da realidade. O que começou a emergir com a complementaridade foi uma incomodidade perturbadora que constrangia não só os autores do projecto, mas também alguns dos seus mais acérrimos adeptos, os quais, no seu afã de manter o estatuto da perspectiva, se expressavam com certa insegurança que lhes fazia inventar uma heurística falaz de componentes que não encaixavam com a realidade da sua investigação. Assim, pois, a desconstrução resultou pertinente enquanto "desautoriza, desconstrói, teórica e praticamente, os axiomas hermenêuticos usuais da identidade totalizável da obra e da simplicidade ou individualidade da assinatura. Em consequência, as mudanças, as variações, os deslocamentos deinteresse temático, as transferências, as traduções, incluso abusivas, e por exemplo o uso abusivo de desconstrução como título, como epígrafe capital de um corpo designificações disseminadas que não se podem sintetizar ou dominar sob um nome, todas essas transformações que «sofrem» os conceitos e as práticas da mais ou menos mal chamada desconstrução, não deveria avaliar-se como acidentes alheios a um presente núcleo essencial… é um pensamento que se pensa nos seus momentos mais ou menos reflexivos sobre o seu sentido geral, ou sobre o sentido do seu caminhar". (Peñalver, 1989: 15). A desconstrução permite descobrir como a obra sofre de desgaste, o seu uso já começa a não dar conta do dizer dos seus postulados, mas antes começa a ser precária nos seus eixos fundamentais, começa a dizer muito metodicamente e a calar pouco ontologicamente; o seu núcleo torna-se como um furúnculo (tumor), como quisto que obstrui os passos fluídos da metáfora, da indicibilidade; a obra passa a ser uma trágica experiência para o autor e uma moda ou método para o leitor e seus seguidores. A desconstrução aparece, não é decisão ou desejo de incomodar, é uma necessidade, uma obrigação do investigador que na sua inconformidade sente que tem que dizer algo a esse respeito. "A desconstrução irrompe num pensamento da escrita, como uma escrita da escrita, que de imediato obriga a outra leitura: não já atraída à compreensão hermenêutica do sentido que quer dizer um discurso, mas antes que atenta à cara oculta deste" (Derrida, 1997: 20). O que se quer expor são, pois, momentos reflexivos sobre o sentido que teve a complementaridade na sua marcha, e como, a partir deste processo, pode emergir uma proposta flexível e rigorosa (mas não rígida). 4.1. Que é a complementaridade etnográfica? Chamamos complementaridade à possibilidade que o investigador tem de reunir de forma inclusiva várias perspectivas e métodos de investigação com o propósito de compreender melhor um fenómeno social. Deste modo, considera o referido fenómeno e o mais próximo possível da realidade vivida pelos sujeitos nele imersos e, portanto, pressupõe que tal compreensão não se alcançaria na sua totalidade se a investigação se restringisse a pequenas observações por parte do investigador. Portanto, deve acudir-se a um princípio complementar que se sustente em várias perspectivas sobre a realidade, assim como a articulação entre teoria substantiva (trabalho de campo) e teoria formal (bibliografia) tal e como o expressam os autores: "Na verdade, cremos que é difícil encontrar o sentido de um grupo social só a partir da contemplação exterior a esse fenómeno; adoptando, por exemplo, uma posição de observador não participante com um amplo marco teórico referencial, ou somente a partir da intervenção activa dentro do fenómeno, sem ter um conhecimento alternativo teórico do mesmo. Pois, no primeiro caso, a descrição não transcenderia a realidade de sentido causal e, no segundo, ficar-se-ia só com a lista de eventos (acções e interacções) sem transcendência no plano real de significado (Jaramillo e Murcia, 2003: 92). Assim, a complementaridade fundamenta-se a partir de duas perspectivas, uma epistemológica, que diz respeito à articulação das diferentes visões sobre o fenómeno e sua relação com o objecto; e outra metodológica, referente à possibilidade de oferecer um caminhar que desvele uma estrutura sociocultural. Como se fundamentam estas perspectivas? Do ponto de vista epistemológico, os autores defendem a complementaridade argumentando que se torna necessário reconhecer cada um dos contributos das diferentes tendências qualitativas (Etnometodología, Fenomenologia, Etnografia Reflexiva e Teoria Fundada, entre outras) com o fim de conseguir uma maior e melhor aproximação à realidade estudada: "Por isso recorremos ao principio de complementaridade como uma possibilidade de articulação com respeito às opções que nos oferece cada tendência" (Jaramillo e Murcia, 2003: 86). É assim que se propõem, à maneira de síntese, diversas perspectivas epistémicas na relação com o fenómeno, tais como: - Realizar os estudos sociais no seu meio natural, tal e como o enuncia o Naturalismo. - A possibilidade de compreender a essência dos fenómenos a partir do reconhecimento das acções e experiências dos sujeitos e a sua consolidação em estruturas socioculturais, propostas impulsionadas pela Fenomenologia, pela Etnometodologia e pelo Estruturalismo. - A importância de compreender as redes de sentido e significado socioculturais a partir dos processos comunicativos num contexto determinado, próprias da hermenêutica. - O apoio num paradigma teórico científico que reconheça a transcendência da comunicação, a tradição e a história, tal como propõe a teoria crítica. - A importância de poder construir teoria a partir da comparação constante, proposta pela teoria fundada. - A necessidade de reconhecer os rasgos culturais e poder reflectir sobre eles a partir da proposta da etnografia reflexiva. - A possibilidade de apoiar as análises de tipo individual e colectivo em histórias orais e de vida. - A possibilidade de utilizar alguns planos prévios de tipo flexível que se possam ir reconfigurando no próprio processo de investigação. - A opção de utilizar algumas técnicas estatísticas, sempre que constituam um meio nessa busca teórica para ajudar a compreender melhor a realidade. - A possibilidade de estender as propostas compreensivas à reflexão e mudança de estruturas socioculturais mediante a crítica emancipadora da comunidade, própria da Investigação Acção Participativa. A proposta epistemológica, em última instância, propõe uma etnografia que procura superar o dilema de neutralidade das perspectivas convencionais; tanto as influenciadas pelo positivismo, como as amparadas no naturalismo. "Um plano que parta da complementaridade etnográfica busca desentranhar as estruturas culturais e a essência dessas estruturas para poder compreendê-las." (Jaramillo e Murcia, 2003: 96). Metodologicamente, a complementaridade pressupõe que a compreensão deve atingir-se a partir de contextos internos e externos, como uma espécie de jogo entre aproximar-se e tomar distância diante dos conceitos alternativos conseguidos nas indagações teóricas (teoria formal) e o acesso aos sujeitos sociais que fazem parte da investigação. Portanto, "para ter esse duplo olhar do contexto interno e externo, o investigador necessita moverse flexivelmente entre a teoria formal e substantiva" (Jaramillo e Murcia, 2003: 97). Não obstante, os autores aclaram que a teoria formal é importante na medida em que ajuda a compreender a realidade cultural a estudar e não segue a análise e compreensão da referida realidade; isto é, a compreensão complementa o fenómeno redimensionando-o à luz de outros estudos similares, sem que estes neguem ou anulem os dados da teoria substantiva que pouco a pouco vai emergindo, tal como os autores o expressam: "O anteriormente referido relaciona-se com a etnografia como complemento, já que encontra a sua explicação na dimensão cultural das manifestações, de onde o facto não se categorizar a partir do teórico mas sim das estruturas possíveis que o texto sociocultural apresenta e em que o teórico não determina a forma de perceber ofenómeno, mas ajudar a percebê-lo melhor". (Jaramillo e Murcia, 2003: 98). A intenção de cruzar as teorias substantiva e formal é descobrir uma estrutura de validação que dê conta da realidade vivida pelos sujeitos; esta estrutura vai emergindo paulatinamente na medida em que os investigadores acedam ao fenómeno a compreender a partir de três momentos, a saber: 1. O momento de pré-configuração da realidade que mostra uma aparência da estrutura da referida realidade e está referido ao momento em que se adquire uma primeira aproximação à possível estrutura sociocultural (pré-estrutura); 2. O momento de configuração da realidade que se inicia com o pôr em cena de uma orientação flexível que permite orientar a busca dessa estrutura. O trabalho de campo, ao desenvolver este momento, deve realizar-se em profundidade (intensiva e extensiva), para obter uma estrutura mas fiável; 3. O momento de re-configuração da realidade encontrada, em que se realiza uma análise dos achados socioculturais a partir de uma tripla perspectiva: a perspectiva do investigador, a perspectiva da teoria formal e a perspectiva da teoria substantiva. (Jaramillo e Murcia, 101) Essa perspectiva e desenho metodológico permitiu que aqueles que se formam em investigação possam guiar-se pelos três momentos da proposta e assim compreender uma realidade que lhes está vedada, pelo que necessitam descobri-la a partir de um processo de configuração permanente em busca de uma estrutura sociocultural. O que a proposta tem de original é que sempre a realidade é vista simultaneamente a partir do substantivo e do formal: inicia-se com a emergência do problema, prossegue até à criação e construção de sentido de uma estrutura que dá conta do fenómeno a compreender. Por conseguinte, são excluídos tanto os a priori teóricos como as observações empíricas da realidade; cada uma por separado dá conta de uma aproximação da realidade, mas não complementar. O investigador inicia então o seu problema com um prejuízo o preconceito denominado extra-teórico; à medida que vai entrando no campo ou fenómeno de estudo, e apoiado pela teoria, vai elaborando uma pré-estrutura a partir de processos indutivos e dedutivos; esta primeira parte lhe serve para precisar o problema, os objectivos e a metodologia; é o momento em que mergulha a fundo na realização do seu trabalho em profundidade, com o fim de poder elaborar uma estrutura sociocultural da realidade compreendida, tal e como se pode observar no quadro seguinte: Fonte: Murcia e Jaramillo, 2003: 103. Ora, pese ao que de didáctico tem a proposta, verifica-se que os estudantes de licenciatura se acolhem a ela para os passos metodológicos expostos anteriormente, em que se evidencia criatividade na emergência do problema e na criação da estrutura, mas os momentos tornam-se rígidos ao ter que passar necessariamente por eles. É aqui que se tornou presente a desconstrução como possibilidade de tirar a complementaridade de sua sedimentação. 4.2. Como se tornou presente a desconstrução? Em primeiro lugar, fazendo uma análise das diferentes investigações e tutorias de grupo pelas quais o princípio de complementaridade abriu caminho, mas em que, por sua vez, a sua utilização foi insuficiente a partir de projectos e exposições que resistem a formar parte de um único modelo; neste sentido, a mesma perspectiva ou desenho metodológico foi-se des-sedimentando na sua utilização. Para tal fim, analisaram-se as primeiras investigações de licenciatura assim como de pós-graduação; na sua análise pôde observar-se como os projectos realizados na licenciatura utilizaram a complementaridade mais como desenho metodológico que como enfoque, isto é, não articularam diversos olhares epistémicos da realidade a compreender; guiaram-se antes pelos três momentos que o modelo comporta. Nestas investigações recolheram-se diversas estruturas da realidade, as quais se encontram publicadas num segundo texto denominado Seis Experiencias en Investigación Cualitativa (Jaramillo e Murcia, 2001). As investigações de doutoramento, pela sua exigência metodológica, fizeram uso da articulação de enfoques e métodos (Ver Murcia, 2006 e Hurtado, 2006). Isto permitiu compreender como a formação em investigação a partir da complementaridade etnográfica em cursos universitários estava a utilizar-se unicamente como caminho rígido a seguir e não como fonte de criação. Em segundo lugar, fez-se uma análise des-sedimentadora à proposta a partir dos seus nós problemáticos, tanto a nível epistemológico como de desenho metodológico. Ao nível epistemológico, pôde notar-se que se propõem diversos olhares ou perspectivas sobre o fenómeno, mas não um eixo que articule. Apresenta-se então um texto que se desvanece na apresentação de uma variedade de enfoques, muito importantes por certo, mas que fazem o leitor do texto perder o fio condutor da complementaridade. Por outro lado, o problema da relação sujeito-objecto e de intersubjectividade não fica resolvido, já que só se apresenta a possibilidade de conhecer por meio da interacção a partir da teoria de A. Schaff, segundo a qual ambos os sujeitos contribuem para o conhecimento; contudo, esta possibilidade enfraquece-se entre a maioria dos enfoques propostos e não se desenvolve em toda a sua profundidade. A subjectividade e a intersubjectividade, neste sentido, tocam-se de soslaio na proposta da Complementaridade. Por último, e em terceiro lugar, expõem-se experiências tanto pessoais como dos estudantes. Analisa-se aí o significado do processo de formação em investigação, produto das assessorias levadas a cabo em vários grupos de investigação nos últimos seis anos; aqui ressalta o papel da subjectividade nos processos de formação. Refere-se então como na investigação, antes de tudo, o investigador é sujeito e ser senti-pensante daquilo que quer compreender, do mesmo modo que as relações que estabelece tanto com os companheiros do projecto como com os sujeitos sociais geram uma nova concepção do olhar, um afecto relacional chamado enamoramento intelectual. Nestas três possibilidades, a desconstrução fez-se presente para dar lugar a mais uma criação, ao nascimento de uma proposta que tenha em conta os lugares e tempos dos sujeitos investigadores a partir de uma realidade que não se deve descobrir, mas sim compreender construtivamente com os sujeitos sociais. Deixa-se ver, então, a necessidade de formar em investigação a partir da sensibilidade em que o sujeito investigador vai às próprias coisas situando-se na sua sensibilidade, já não cruzando somente métodos indutivos e dedutivos, mas apresentando-se a si mesmo como sujeito processual de acção que se move ambiguamente na passividade, para ver-se no meio do mundo, e na actividade, para actuar graças a ela: "Ambiguidade da passividade e da actividade na descrição da sensibilidade, fixa em realidade este novo tipo de consciência que se chamará corpo próprio, corpo-sujeito, sujeito como corpo e não como simples paralelo como objecto representado" (Levinas, 1967: 71). Compreendendo então que o eixo articulador da complementaridade se encontra na sensibilidade do próprio sujeito que vive encarnadamente em um mundo que não é objecto de estudo mas sim de abertura, tenta expor-se uma proposta de formação em investigação construída a partir da subjectividade dos estudantes-investigadores como possibilidade de formação de uma vida que busca o sentido co-existindo e alargando os horizontes possíveis. 5. ESBOÇOS DE UMA PROPOSTA FECUNDADA: o provado andando 5.1 Introdução Como fazer da investigação um processo que ultrapasse a razão? Talvez se nos constituírmos com aquilo que nos ultrapassa, poderemos senti-la como oportunidade para alargar horizontes de vida e não continuar presos na sua instrumentalização. Primeiro, fazermos da investigação um jogar, para que se torne lúdica e ganhe significado; segundo, enamorarmo-nos da área ou tema que nos apaixona para sentirmos gozo na sua exploração; e, terceiro, manter a suspeita de que nos faltou algo mais por descobrir, por encontrar, outra muralha a franquear – um desejo não acabado. Ao exprimir-se como jogar, a investigação torna-se-nos acção natural, na medida em que "o vaivém do movimento lúdico aparece como por si mesmo… como se caminhasse [sozinha]. A facilidade do jogo que, desde logo, não necessita ser sempre verdadeira falta de esforço, mas significa, fenomenologicamente, só a falta de um sentir-se esforçado. Experimenta-se este subjectivamente como descarga" (Gadamer, 1993: 148). Assumir a investigação como jogo é deixarmo-nos abandonar ao lúdico que ela comporta, ao dever da iniciativa do «ter que» pelo «querer ser». Não podemos continuar entendendo a investigação apenas como produção de conhecimento, ou geração de novo conhecimento; mas sim como uma com-natural conjectura que nos acompanha, pelo que se nos torna impossível renunciar a ela; a mesma busca pelo desconhecido já nos produz prazer e descarga subjectiva. Entregarmo-nos por completo às sombras da curiosidade incessante, para saber que haverá para além de… é deixar que a investigação jogue e seja pêndulo de realização no próprio movimento e não o alcançado em cada um dos seus extremos (nem chegada, nem partida); a investigação é acção de fantasia e realidade muito similar ao que nos produz o infinito do jogar. Quanto ao amor, diremos que a investigação é natural na nossa condição humana, enquanto queremos investigar aquilo que realmente nos apaixona, nos enamora, nos envolve. Ela não pode continuar alheada da nossa natureza, isso seria ir contra-natura. Assim se explica por que razão para alguns dos nossos estudantes de secundário e mesmo da Universidade é tão aborrecido investigar. Muitas vezes, quando o docente propõe a ideia de investigação e os estudantes se unem a ela, a visão do que se quer investigar limita-se enquanto não se encarna o projecto, isto é, não alcança passar pela pele dos estudantes. A não ser que o docente saiba transmitir essa inquietude de si que comporta o projecto e essa magia produtora e des-paralizadora que o mobiliza mais além que a razão, será muito difícil aos estudantes sentir um problema de investigação como seu. Tudo é mais fácil e melhor quando a ideia do que se quer investigar parte dos próprios jovens investigadores; todavia, isso não quer dizer que docentes e estudantes se prendam do mesmo fio para avançar pelos caminhos escabrosos que leva em si o projecto. Mas quando um só, e não todos, lança a visão, difícil é o avanço e tensas as relações. O amor, aparte de emocionar-nos, implica compromisso, luta e entrega. Não nos enamorarmos do que se quer investigar é fazer da investigação algo tedioso, fastidioso, cheio de fórmulas que há que cumprir; a última pretensão é o grau académico. Deste modo, existem profissionais que viveram a carga mortífera de ter que investigar. Por último (a respeito do desejo), parece-me que não se investiga algo que não se deseja, pois a surpresa, a intriga e a conjectura são permanentemente adormecidos pela teoria em excesso; isso se vê reflectido na citação de inúmeros autores, ficando mais escondida a identidade de quem escreve e investiga; a força do escrito recai nos raciocínios e argumentos de outros e não nos pensamentos próprios. A investigação é esse desejo de possuir compreensivamente aquilo que não entendemos e nos move à reflexão, é a insaciabilidade por com-preender, por buscar o inquietante, o infinito da nossa finitude. Por natureza sempre vamos mais além do que necessitamos. Se nas aulas de investigação nos oferecem os conceitos e a totalidade do processo acerca de como investigar, pouca graça encontraremos nos resultados, pois já de antemão se sabiam através de hipóteses. Na investigação, necessitamos ir atrás da pegada de…, buscar pistas, criar métodos, inventar labirintos sem saídas, confundirmo-nos com o inesperado. Conhece uma cidade quem se perde nela. Investiga aquele que não sabe que caminho tomar; o desejo nos empurra a descobrir e criar caminhos outros (não outros caminhos somados aos já existentes) que nunca esperámos encontrar, menos ainda criar; abrir ousadamente veredas que outros não se tenham aventurado a inventar. Tornar visíveis os caminhos e descobrir territórios é possível se emergem no meio das turmas e dos seminários problemas reais de investigação e não só exercícios para aprender a investigar¹ Zemelman (2005) fala-nos de ir até problemas epistémicos e não teóricos; isto é, nomear as coisas de outra maneira, inclusive, nomear o in-nomeado para além do que os conceitos e ideias formais dizem acerca do que é real. O desejo torna-nos criadores de realidades e alarga-nos ao mundo. A investigação torna-se natural em nós na medida que a assumirmos como parte da nossa condição humana: simplesmente é o que é e não outra coisa, como o amor, o jogo e o desejo. Façamos de nossas aulas pequenos-grandes projectos de investigação, não importa se não é aula de «Metodologia da Investigação»; ao contrário, investigamos precisamente porque a natureza é portadora de criação que joga no meio do amor e do desejo (Jaramillo, 2006). Isto permite que tanto estudantes de investigação como investigadores dêem conta de uma realidade de que eles mesmos fazem parte, assim"teremos que assumir as consequências que isso tem sobre a linguagem e o que entendemos por [ciência] e por história" (Zemelman, 2005: 94). Não podemos encerrar e ordenar num currículo o que por natureza é livre e insuspeitado; algo excitante em que já não importa o tempo de aula, nem o sítio de encontro, nem a nota, ou se ganhei ou perdi o semestre, simplesmente investigo, jogo, desejo e me enamoro. 5.2 Desfiando sobre solo resvaladiço: por um processo rigoroso mas não rígido Dividi a presente proposta metodológica em três partes: a primeira orientada para um processo de formação-enacção com o propósito de conseguir espaços e encontros para a sensibilização de um conhecimento que chamei Saboreado; a segunda, como a atitude fenomenológica de habitar e constituir a pergunta de investigação denominado Habitando na pergunta; e a terceira, como a capacidade que tem o investigador de criar o seu própria itinerário de investigação: Jogando a inventar modelos. Cada uma delas tem seus temas e construções propositivas que a sustentam. A proposta em si quer recolher as riquezas do Principio de Complementaridade, assim como as suas fraquezas, fazendo da presente investigação uma obra com-figura-dora; isto é, criadora. 5.2.1 Formação-Enacção Para a UNESCO (1989), a formação entende-se em dois sentidos: por um lado, como uma aquisição de habilidades, conhecimentos, actividades e condutas intimamente associadas ao campo profissional e, por outro, "como um processo que busca a consecução de um desenvolvimento pessoal, social e profissional ao longo da vida do indivíduos com a finalidade de melhorar a sua qualidade de vida e a da sua colectividade". Esta noção implica a consideração do sistema educativo como um todo, um continuo em que se outorga à educação superior uma revolução; para a UNESCO, a chave para o século XXI é a formação ao longo da vida. A formação em investigação, a partir das perspectivas anteriores, apresenta-se-nos como um repto à sociedade actual, já que o sujeito não só conhece a sua disciplina, mas também se conhece a si mesmo, aos outros e, o mais importante, se posiciona na ordem histórica e cultural em que lhe tocou viver. Lamentavelmente, a nossa tradição ocidental propiciou a compreensão do conhecimento como representação, isto é, como Espelho da Natureza, verificação fiel do mundo; ao contrário, Rorty argumenta que o "conhecimento não consiste na apreensão da verdadeira realidade dada pelo cartesianismo, mas na forma de adquirir hábitos para fazer frente à dita realidade" (1991:15). Os critérios de objectividade, se é que existem, estariam aceites por consenso dentro de uma comunidade académica como «acordos não forçados», passariam a ser chamados processos de objectivação (León 1997). A formação, por conseguinte, é entendida como aquela categoria que nos permite mudar (Feitosa, 2006), fazer constantemente frente à realidade através de processos de cognição enactiva e não representativa como geralmente nos foi ensinado na educação superior. Como entendo a cognição enactiva? Para Varela (1998: 89) "a maior capacidade da cognição consiste em grande medida em colocar questões relevantes que vão surgindo em cada momento da nossa vida. Estas não são predefinidas mas enactuadas: fazem-se emergir a partir de um pano de fundo, sendo relevante aquilo que o nosso sentido comum julga como tal, sempre dentro de um contexto". A enacção, fundamentada em fenomenólogos como Merleau-Ponty², considera que na cognição intervêm o sentido comum³ e o contexto como possibilidade para configurar o nosso mundo. Estes dois não são artefactos residuais que se possam eliminar de nossa humana maneira de viver. Isso quer dizer que o conhecimento se relaciona com o facto de estar num mundo que resulta inseparável do nosso corpo, da nossa linguagem e da nossa história social; estamos sempre arrojados encarnadamente nele à maneira do eu posso (Levinas, 1967). Na enacção, mundo dado e mundo percebido definem-se mutuamente, são correlativos, o mundo é mais que solipsismo e objetividade; as atitudes cognitivas estão inextricavelmente enlaçadas com uma história vivida e ininterrupta, tal como um caminho que não existe mas que se faz ao andar. Aqui a acção efectiva-se: enactua; isto é, emerge. Formação enactiva é devir humano, já que o sujeito é constituído e constituinte, actor social do seu processo. A presente proposta tem em conta a formação em investigação de um estudante que interactua com um mundo que o surpreende; isto é, agarra-o na sua historicidade. Desde esse momento já não será o mesmo, enquanto se abriu primeiramente ao mundo, existe co-implicadamente com ele. A outra abertura é ao Outro; o mundo não é só dele, também participam os companheiros de aula e os sujeitos sociais do estudo. Deste modo, não pode haver solipsismo: "Pois o mundo que vejo não é só meu, no sentido particular: eu vejo uma árvore, as perspectivas que tenho dela dependem da posição do meu corpo; todavia, ainda ficam lacunas que albergam a própria coisa. Quando digo vejo uma árvore, o que vejo é a cara subjectiva da percepção. Se outro olhar se pousa sobre a árvore, a minha percepção pousa-se sobre a árvore e o corpo do outro que o olha, entabulando-se uma relação que não corresponde a nenhuma das duas relações que oferece uma análise solipsista" (Aguirre, 2006: 56). A segunda abertura permite uma formação intersubjectiva. Nunca veremos a realidade na sua totalidade, mas só os múltiplos olhares sobre a realidade alimentada pela história dos Outros. Assim, o mundo não é só meu; nele participam os outros, ao mesmo tempo que eu me faço partícipe dos outros; o que se chama eu está oferecido ao olhar estranho – assim, em meu olhar "entram quantos queiram participar dele" (Ponty, 1970: 83). Esta primeira parte do capítulo V envolve três possibilidades nos processos pedagógicos e didácticos dos estudantes: o primeiro encontra-se relacionado com poder realizar uma sensibilização para além dos conhecimentos teórico-formais e encontrar saberes dados no mundo da vida (Lebenswelt); para isso, deve fazer-se uma distinção entre o saber, o conhecer e a sua constituição epistémica, parte que denominei co-saber; posteriormente, devem explicitar-se processos de formação por um conhecimento que parta do gosto por conhecer e não só pela necessidade tal como no-la ensinaram nos textos de «metodologia da investigação»; aqui jogam parte importante as afirmações sobre o desejo como infinitude esboçada por Levinas (1977) que permitem um transbordar da subjectividade; por último, parece-me importante que os estudantes-investigadores conheçam nos seus processos de formação-enactivos as implicações que tem a intersubjectividade a partir de um corpo vivido ou corpo sujeito posto em relação com os Outros. 5.2.2 Habitando a pergunta Para Merleau-Ponty, o verdadeiro filósofo não pretende interrogar com o afã de ir preenchendo inquietudes; o seu afã é o de perguntar pela origem das perguntas e das respostas, sendo a interrogação o que dá vida a todas as perguntas de conhecimento (Ponty, s.f.: 30). Esta segunda parte da proposta, põe em cena as possibilidades que tem o investigador de aproximar-se do objecto de estudo constituído por diferentes caminhos: como é que o estudante investigador se vai descobrindo e configurando no projecto de investigação? Como é entendida a subjectividade neste processo? Habitar a pergunta, ver-se no meio dela, por sua vez, vê-la por muitas arestas e perspectivas que saem de tempos e lugares absolutos de uma cientificidade positiva; poderíamos dizer que a pergunta emerge ao constituir ela própria o seu tempo e o seu lugar. Deste modo, a pergunta faz-se presente enquanto é parte dos investigadores e não só uma indagação que lhes é alheia. A pergunta chega, é percebida constitutivamente, deixa de ser somente objectiva e teórica; poderíamos dizer, fenomenologicamente, que se constitui em Morada, em indagação original na qual o investigador pode reconhecê-la e fazê-la sua, é co-dependente dela (e ela dele) e, graças a isso, é livre para decidir como desejaria construir o itinerário metodológico para resolvê-la. Olhar a pergunta «perceptivamente» é habitá-la e captá-la a partir de todos os olhares, segundo a perspectiva donde se olhe (Merleau-Ponty, 1957); é como olhar uma casa de certo ângulo, o qual consistiria em ter à nossa disposição os horizontes das coisas mas não poder captá-la na sua totalidade, pois a casa mostraria a sua outra cara em outra direcção; teria portanto uma perspectiva. Com isto quero explicar que o espaço da pergunta corresponde à existência de muitos horizontes; isto é, que na sua constituição a vejo de um lado, mas ela encontra-se relacionada com um contexto donde é mirada de outras maneiras. Não existe pois uma totalidade da pergunta, mas a pergunta em perspectiva da maneira como ela se apresenta diante dos estudantes-investigadores. Por outro lado, podemos olhar e sentir a pergunta temporalmente; isto é, num tempo que não é absoluto; tal como na casa, vemos a partir de um presente as janelas e as fendas que nos falam da casa construída pelos avós e da qual guardamos recordações dos passeios e jardins por onde andávamos; a casa guarda um tempo passado/presente para quem a percebe (Aguirre, 2006), mas o passado pode ter sido alterado pela recordação ou o presente pode significar para outros algo distinto do que para nós foi a casa do avô; desta forma, não existe um tempo absoluto mas um tempo de horizontes, podendo verse a casa a partir de muitas heterocronías. O mesmo sucede com a pergunta, a qual é vista a partir de uma temporalidade, de uma história pessoal do investigador e das relações dadas com os sujeitos sociais. Desta maneira, a pergunta é percebida subjectivamente e inter-corporeamente a partir de um tempo e um lugar. Aqui a pergunta torna-se-nos Morada, isto é, um lugar constituído para habitar no meio dela. A segunda parte da proposta apresentada no Capítulo V envolve três componentes, a saber: - o investigador posto no limite – na emergência da pergunta jogam um papel importante os seus afectos, a sua biografia e a aderência através de saberes ao tema de investigação; - o segundo componente denomina-se e isso com que se come?, no qual se pretendem dar ferramentas (entendidas estas como possibilidades) para que os estudantes, através da sua subjectividade, possam buscar não somente dados objectivos nos livros, mas também dados subjectivos e inter-subjectivos; - o terceiro componente consiste em como, depois de ter indagado de várias maneiras e buscado por múltiplos caminhos, o estudante-investigador dá forma à sua pergunta; isto é, avalia as situações, entra em contacto com os sujeitos sociais implicados, confere constantemente as teorias, até chegar ao limite de decidir criativamente o que deseja investigar, secção denominada estar decidido a decidir. A partir destes três elementos, o estudante-investigador poderá sentir a pergunta como Morada, como sua… como algo que lhe pertence; já não é exterior a ela, mas será parte implicada com ela. 5.2.3. Jogando a inventar modelos Que é um modelo e qual é a sua função no interior da ciência? Segundo Sierra, "os modelos são construções teóricas hipotéticas, susceptíveis de matematização, com as quais se pretende representar um sector da realidade afim de a estudar e de verificar a teoria" (1986: 34). Vistos assim, os modelos são as lentes que guiam o investigador na compreensão ou explicação da realidade mas, por seu lado, são palas que impedem de ver outros sectores que se encontram fora do modelo, restringindo desta maneira a capacidade de ver mais além do que podemos ver. Assim como o olhar não é só fisiológico mas podemos ver para além das nossas limitações físicas, também na investigação a nossa capacidade de ver a realidade sai dos enquadramentos que nos oferecem os modelos de investigação. Portanto, os modelos criam-se para além das obturações teóricas, e devem ser abertos e expansivos até ao ponto de transbordar as nossas explicações. Para explicar isto melhor, permitir-me-ei citar um exemplo que dá Foerster acerca de como a nossa invenção da realidade sai de esquemas tipificados dados pelos modelos: "Castaneda foi ao povoado de Sonora, no México, a conhecer um bruxo chamado Don Juan, a quem pediu que o ensinasse a ver. Assim, Don Juan interna-se com Castaneda no meio da selva mexicana. Caminham uma ou duas horas, e de imediato Don Juan exclama: "Olha, olha o que há aí! Viste?". Castaneda responde-lhe: "Não. não vi". Continuam caminhando, e uns dez minutos mais tarde Don Juan volta a deter-se e exclama: "Olha, olha alí! Viste?". Castaneda olha e responde: "Não, não vi nada". "Ah!", é a lacónica resposta de Don Juan. "Continuam a sua marcha e volta a suceder o mesmo duas ou três vezes, mas Castaneda nunca vê nada; até que, por fim, Don Juan encontra a solução: "Agora entendo qual é o teu problema! – diz-lhe – Tu não podes ver o que não podesexplicar. Trata de te esqueceres das tuas explicações e começarás a ver" (1995: 243). Não é que as explicações não sejam importantes, mas é que ao lado delas encontram-se aspectos qualitativos que participam na criação do conhecimento e por aí dos modelos. O erro em que se pode cair é ver somente causalidades nas realidades sociais buscando nelas apenas as partes de um sistema metodológico afincadas em modelos mecânicos. Se se assume o problema como Morada, este não pode resolver-se senão através de modelos criativos que permitem ao problema habitar no seu espaço/tempo e não fechá-lo por meio de um modelo de relação linear-causal ou circularч pré-desenhado através do método científico. Isto não quer dizer que os modelos quantitativos ou qualitativos existentes não sejam importantes para ajudar a resolver um problema; mas, em meu entender, um modelo não se aplica a um problema determinado como cópia fiel sendo distintas as realidades e as percepções e vivenciando-se as experiências de maneira singular. O importante é como os estudantes-investigadores conhecem as explicações epistemológicas dos modelos e a sua justificação na solução ou resolução de problemas com uma lógica explicativa o compreensiva. Assim, colocam-se em situação e com intencionalidade a respeito de que tipo de modelo é o mais pertinente e que mudanças heurísticas haverão que efectuar no intento de solucionar o seu problema. Ora bem, as mudanças que têm de sofrer os modelos pré-desenhados não são de ordem mecânica; não é mudando as técnicas o instrumentos no interior do modelo, nem somente a forma de aproximação aos sujeitos sociais; a mudança de lógica sistémica, em palavras de Morin (2000), é a auto-eco-organização, isto é, relacional entendida como a capacidade de efectuar uma mudança de segunda ordem que permita uma reorganização do modelo enquanto tal e não só as suas partes. Se se muda uma parte do modelo, agudiza-se como tal o sistema, pois é a sua lógica interna e não as partes que o conformam que pode não se ajustar ao problema. Por conseguinte, o estudante investigador deve adquirir a capacidade de ver co-implicadamente o todo nas partes e as partes no todo de um modelo ou desenho determinado; assim, da desordem lógica provocada no modelo pode estabelecer-se uma nova ordem; isto só é possível colocando em jogo a criatividade. Recorde-se que, em investigação, o problema é o que determina o modelo e não o modelo que determina o problema. À medida que vamos configurando o problema, vamos criando o modelo e, por causa dele, um desenho. O desenho, ao contrário do modelo, é de ordem mais aberta; permite confeccionar-se permanentemente com bases nos diferentes matizes que vai assumindo o problema; o seu colorido permite desenhar múltiplas formas de produzir aproximações, reflexões, erros (vistos estes como possibilidade de crescimento: Feitosa, 2006), retrocessos, avanços… toda uma serie de possibilidades criativas utilizadas pelo investigador quando habita no seu problema. Como diria De la Cuesta "não se investiga por desenho mas desenha-se ao investigar… dado o seu carácter emergente, a verdadeira investigação é com frequência desordenada, confusa e frustrante, e além disso não é linear" (2004: 8). Os modelos assumidos a partir de um co-saber ou saber conceptual permitem-nos orientar-nos no mundo da experiência, prever situações e às vezes determinar incluso as experiências (Glasersfeld, 1998). Esta perspectiva está muito ligada à de Galindo (1998) quando expressa que aquele que indaga necessita dar-se conta do que está fazendo continuamente, chegue ou não a consegui-lo. As possibilidades têm pois que ser abertas, indagam de um modo mais livre, respeitando a intuição. Assim, os estudantes-investigadores devem aprender a jogar com os modelos e os desenhos, seleccionar perspectivas, considerar múltiplas opções e estar dispostos a realizar e decidir criativamente as invenções alcançadas para resolver um problema que sentem seu; isso depende, obviamente, da rede de relações concretas de antagonismo, de complementaridade e de cooperação entre os múltiplos pontos de vista em jogo. Jogo não significa aqui pôr em cena, mas as múltiplas combinações que pode realizar o estudante para ver o problema. "…falar de jogo é indicio de uma maior consciência acerca dos mecanismos que presidem à historia da natureza. Portanto, não se trata só da utilização de uma metáfora cómoda… A natureza e a história jogam sempre jogos interessantes, isto é, jogos que não possuem uma estratégia necessariamente vencedora elaborada no começo. O decurso do jogo sucede sempre na interacção e por meio da interacção entre as regras postas como vínculos e como constitutivas do jogo, a casualidade e a contingência dos sucessos particulares e das eleições particulares, e as estratégias dos jogadores dirigidas a utilizar as regras e a casualidade para construir novos cenários e novas possibilidades" (Ceruti, 1998: 144). O jogo como infinidade permite-nos jogar com os caminhos; isso torna as possibilidades infinitas, o importante será a opção metamorfoseada que o estudante faça com o problema, isso impulsionará a realizar o jogo… o seu jogo. Esta terceira parte da proposta implica então esses processos de criação. Embora a criatividade faça parte de toda a proposta, porém, o que se pretende é dar algumas orientações quanto ao desenho-metodológico na execução do projecto de investigação; o que se pretende não é dar receitas mas aberturas na formação de estudantesinvestigadores. Por isso"O tutor raramente dará receitas a um investigador em formação; a maioria das vezes lhe fará perguntas não com a esperança de obter uma resposta imediata mas de promover a sua reflexão. Enquanto que a orientação académica e metodológica do tutor serve de guia ao estudante, esta nunca será um mandato a cumprir ou um caminho a transitar; permitir-se-á a experimentação e a aprendizagem inclusive dos erros; é na prática da investigação donde realmente se dirimem as questões metodológicas. A direcção do estudo há-de ser encaminhada a fomentar a reflexividade do investigador em formação"(De la Cuesta, 2004: 5). Os pontos que confirmam esta parte, tal como os anteriores, são três: o primeiro faz referência a como, a partir da heurística, "se desenfocam os modelos e enfoques" e se permite ao estudante-investigador construir outros focos; o segundo ponto consta das diferentes oportunidades que tem o investigador para jogar "complementarmente fazendo agrupamentos raros" a partir de processos de triangulação; isto é, poder perceber o problema de várias maneiras; por último, como terceiro ponto, propõe-se a possibilidade e a liberdade do investigador para que possa alargar o seu horizonte de vida a partir da investigação realizada; para tal efeito, oferecem-se igualmente possibilidades para que se veja no todo investigado e não como alheio a ele. Não se trata, como antes dizíamos, de formar consensos com a comunidade ou os sujeitos sociais para extrair deles informação, tão pouco se trata de elaborar arquivos secretos da experiência do investigador no campo longínquo da subjectividade dos sujeitos em questão; trata-se de investigar co-implicadamente com o Outro a ponto de que a sua percepção sobre o co-saber particular que está investigando, altere o seu ponto de vista, o mude para horizontes de onde poderá dizer que já não é o mesmo./ CONCLUSÃO No desenho, os métodos (caminhos) co-nascem, as técnicas são possibilidades e as teorias são as metáforas constituídas tanto objectiva como subjectivamente. O investigador em formação há-de tornar o seu posicionamento consciente frente à natureza da prática da investigação e do que constitui conhecimento. Fazê-lo é o primeiro passo da subjectividade. Quem é o investigador, como usa o seu «si mesmo» durante o estudo e como se transforma são questões nucleares na formação para a investigação; "as finalidades da educação são o resultado menos da reflexão racional que do interesse, do imaginário ou de um acto de fé individual ou colectivo, actos que podemos chamar meta-racionais. O trabalho do educador exige, portanto, por um lado, a reflexão racional sobre os meios e, por outro, a sua crença e a aposta no futuro."(Azevedo & Louro, 2006: 21)/ ¹ Entende-se aqui que o problema se identifica a partir de uma situação que produz o se prevê que possa produzir um conflito e que, como assinalam Jessup M. y Castellanos R., em principio não tem una solução evidente ou um caminho evidente para obtê-la. Portanto, requere-se de um processo de análise e tomada de decisões que permita a eleição mais apropriada de acordo com as características do contexto. Desta maneira, um problema é diferente de um exercício. No se poderiam considerar como problemas mas sim como exercícios aqueles questionamentos que costumam aparecer nos livros de texto e cujas respostas estão previamente definidas (Citado por Corchuelo, 2006). ² Merleau-Ponty (1970: 48), estabelece uma relação indissolúvel entre acção e conhecimento – conhecedor e conhecido através da percepção ou como ele lhe chama "Fé Perceptiva" que é a que nos dá a certeza de que "estamos ocupando o mundo com o nosso corpo, sem ter que eleger nem distinguir sequer entre a segurança de ver e ver o verdadeiro, porque são fundamentalmente as mesmas coisas" por outras palavras, "desequilibra-se a velha suspeita de que tudo me engana e que o conhecimento da realidade é inacessível para os sentidos; o corpo sente o mundo que é e portanto é preponderante o seu papel na busca da verdade." (Aguirre, 2006: 58) ³ Para P. Berger y T Luckmann (1983), os sujeitos partilhamos um sentido comuns a realidade; é a atitude natural, é a atitude da consciência do sentido comum, precisamente porque se refere a um mundo que é comum a muitos homens. O conhecimento do sentido comum é o que partilho com outros nas rotinas normais e auto-evidentes da vida quotidiana. Cf. La Construcción Social de la Realidad. p. 41. ч Uma relação causal denomina-se linear quando uma série de proposições não regressam, fechando um círculo, ao seu ponto de inicio; isto implica que nunca o resultado de algo venha a exercer os seus efeitos sobre a sua própria origem. Portanto, não intervêm processos de retroalimentação e a sequência das causas e efeitos não regressam ao ponto de partida (Ceberio & y Watzlawick, 1998: 40). ¹ Entende-se aqui que o problema se identifica a partir de uma situação que produz o se prevê que possa produzir um conflito e que, como assinalam Jessup M. y Castellanos R., em principio não tem una solução evidente ou um caminho evidente para obtê-la. Portanto, requere-se de um processo de análise e tomada de decisões que permita a eleição mais apropriada de acordo com as características do contexto. Desta maneira, um problema é diferente de um exercício. No se poderiam considerar como problemas mas sim como exercícios aqueles questionamentos que costumam aparecer nos livros de texto e cujas respostas estão previamente definidas (Citado por Corchuelo, 2006). ² Merleau-Ponty (1970: 48), estabelece uma relação indissolúvel entre acção e conhecimento – conhecedor e conhecido através da percepção ou como ele lhe chama "Fé Perceptiva" que é a que nos dá a certeza de que "estamos ocupando o mundo com o nosso corpo, sem ter que eleger nem distinguir sequer entre a segurança de ver e ver o verdadeiro, porque são fundamentalmente as mesmas coisas" por outras palavras, "desequilibra-se a velha suspeita de que tudo me engana e que o conhecimento da realidade é inacessível para os sentidos; o corpo sente o mundo que é e portanto é preponderante o seu papel na busca da verdade." (Aguirre, 2006: 58) ³ Para P. Berger y T Luckmann (1983), os sujeitos partilhamos um sentido comuns a realidade; é a atitude natural, é a atitude da consciência do sentido comum, precisamente porque se refere a um mundo que é comum a muitos homens. O conhecimento do sentido comum é o que partilho com outros nas rotinas normais e auto-evidentes da vida quotidiana. Cf. La Construcción Social de la Realidad. p. 41. ч Uma relação causal denomina-se linear quando uma série de proposições não regressam, fechando um círculo, ao seu ponto de inicio; isto implica que nunca o resultado de algo venha a exercer os seus efeitos sobre a sua própria origem. Portanto, não intervêm processos de retroalimentação e a sequência das causas e efeitos não regressam ao ponto de partida (Ceberio & y Watzlawick, 1998: 40).
O presente estudo trata a problemática da definição, por parte do direito fiscal, da base tributável e do procedimento da sua determinação na tributação do lucro empresarial. Constitui um dado de história do directo positivo que, na generalidade dos ordenamentos jurídicos, e desde os primórdios da tributação sobre o lucro mercantil, o direito tributário utilizou a contabilidade mercantil como um instrumento para o procedimento de determinação do rendimento a gravar. No entanto, apesar de uma aparente progressão na direcção de uma apregoada autonomia do procedimento de determinação do lucro tributável, que prossiga os seus fins de modo independente da contabilidade elaborada para fins mercantis e que ao mesmo tempo não pretenda exercer influência sobre a mesma; apesar do amplo debate travado em torno da possibilidade de uma desconexão entre lucro tributável e resultado contabilístico, até ao momento presente nenhum ordenamento, de entre os que comparamos neste estudo, logrou alcançar esta separação. Parece, pois, existir uma impossibilidade de cindir as duas entidades, como se a entidade rendimento tributável não pudesse ter uma realidade autónoma, ou como se se tratasse de uma realidade que não pode tomar consistência sem se concretizar como uma projecção da contabilidade mercantil. No entanto, do ponto de vista da técnica legislativa, o direito fiscal sempre estabeleceu uma relação ambígua com a contabilidade mercantil, não definindo nunca com suficiente precisão e em termos verbalmente claros, como se realiza, em que planos e com que limites se produz, a relação com a contabilidade mercantil. A necessidade de uma tal definição afigura-se inquestionável, uma vez que a contabilidade mercantil é uma realidade jurídica totalmente desenvolvida dentro de um ramo do ordenamento jurídico – o direito mercantil – diferente do direito tributário, que além o mais se caracteriza por ser um ramo do direito privado, prosseguindo, por tanto, fins totalmente distintos dos fins da tributação e regendo-se por uns princípios próprios, que fixam as suas raízes não direito civil e que, por conseguinte, não podem coincidir com os princípios do direito tributário. Poderia pensar-se que a questão se reconduz simplesmente, em última análise, à clássica problemática, situada não plano da interpretação e da aplicação das normas, da dependência ou independência qualificadora das normas tributárias perante os outros ramos do direito, e em particular o direito civil. Se assim fosse, a questão da relação entre a determinação do rendimento tributável e a contabilidade mercantil resolver-se-ia numa alternativa a dirimir pelo legislador: ou o direito tributário se serviria do conceito de lucro elaborado pelo direito civil com um carácter auxiliar, e então haveria que acudir ao substratum económico que constitui o objecto da imposição; ou, para se ligar à forma jurídica que a quantificação do lucro reveste não direito mercantil, aceita o conceito de lucro elaborado pelo direito civil. Sem prejuízo de que a problemática referida represente uma parte importante da questão sobre a qual se debruça este estudo, parece também, pelo menos a partir duma perspectiva apriorística, que não pode esgotar-se nesta mesma problemática a questão da relação entre a determinação do lucro tributável e a contabilidade mercantil. Pois quando, em relação à problemática da dependência ou independência qualificadora do direito tributário, se refere a ligação que o direito tributário estabelece, ou não estabelece, com uma "determinada forma jurídica" oriunda do direito civil, por "forma jurídica" pretende-se significar ainda um topos jurídico, um tipo abstracto do qual se serve a norma civil para classificar uma relação jurídica. Assim, quando a situação de facto à qual se vincula o imposto, reveste a forma de uma relação jurídica, a questão que se colocará, desde a perspectiva da dependência o independência qualificadora do direito tributário, é a de saber se essa relação jurídica deve valorar-se, isto é, deve "definir-se e classificar-se", com base na disposição legal de direito privado que enuncia o tipo abstracto, dando-lhe um nome próprio, fixando os seus aspectos essenciais e a sua regulação jurídica. Transposto para o campo específico do nosso tema de análise, o legislador fiscal estaria perante a seguinte alternativa: ou estabeleceria que o que constitui lucro para o direito mercantil, é também lucro para o direito fiscal; ou optaria por estabelecer uma qualificação própria da situação de facto "lucro". No entanto, com não pouca frequência, o direito tributário não opta por nenhuma destas hipóteses. Com efeito, mesmo nos casos em que o direito fiscal assume explicitamente a opção de uma qualificação autónoma do conceito de rendimento, que em aspectos pontuais pode divergir substancialmente do conceito mercantil, nunca deixa de estabelecer uma conexão entre a qualificação concreta que se realiza no direito tributário, e a qualificação concreta que para a mesma situação tenha sido realizada no direito mercantil. Isto para já não referir que, também em frequentes ocasiões, o direito fiscal se avoca a função de substituir-se ao direito mercantil, tanto na formulação do tipo abstracto "lucro", como na definição de alguns aspectos da sua regulação jurídica para efeitos privados. Afigura-se assim, que a questão da relação entre a determinação do lucro tributável e a contabilidade mercantil, dentro da problemática clássica da relação entre o direito tributário e os restantes ramos do direito, representará pelo menos um caso com bastantes peculiaridades. Um segundo dado histórico que se recolhe da evolução legislativa da tributação dor entendimento é que, em nenhum caso, esta relação entre o direito tributário e a contabilidade mercantil se mostrou isenta de problemas na interpretação e aplicação do direito, resultando deste facto consequências funestas, que perduram na actualidade tanto n plano da segurança jurídica como no plano mais pragmático dum acatamento pacífico das leis fiscais por parte dos contribuintes. Ao longo de toda a evolução da história da imposição sobre o rendimento, esta relação estabeleceu-se através de diversas formas e com vários graus e efeitos jurídicos. Nos ordenamentos continentais, de um modo geral – como em Espanha, desde a "Contribuição sobre os rendimentos da riqueza mobiliária" de 1900, o na Alemanha, desde as leis impositivas de Bremem e Saxónia de 1874 – esta relação instrumental foi formalmente estabelecida na legislação fiscal, ainda que por meio de umas fórmulas verbais de escassa precisão. Noutros ordenamentos, como o britânico, a mesma relação estabeleceu-se também, desde o início da imposição, de modo implícito, tendo sido sancionada tanto pela prática administrativa como pela jurisprudência. Noutros ordenamentos, como o francês ou o norte-americano, nos quais podemos constatar, desde cedo, a existência de uma base legislativa formulada com uma extrema imprecisão, coube à jurisprudência o papel decisivo na delimitação da aludida relação. Mas a jurisprudência destes países mostra-se ela mesma demasiado oscilante, para se poder extrair a partir desta fonte do direito uma delimitação precisa das relações entre os dois mencionados sectores do direito. A indefinição é, portanto, o traço que caracteriza a relação entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil, na generalidade dos ordenamentos jurídicos e ao longo de toda a história da tributação do rendimento, até à actualidade. Esta relação da determinação da base tributável com a contabilidade mercantil, que não é uma relação simples mas que reveste múltiplos aspectos muito distintos, deve ser vista como um elemento da definição da obrigação tributária. Um elemento, aliás, de uma relevância especial, já que não só forma a pedra angular da definição da base tributável normativa, como influi decisivamente na quantificação da base tributável factual; e como se isto não fosse bastante, produzem-se ainda efeitos secundários da máxima relevância no âmbito de umas relações jurídicas situadas noutro sector do ordenamento jurídico, relações estas que não têm nenhuma conexão com a relação tributária. Referimo-nos às relações de direito mercantil, as quais se estabelecem entre o ente sujeito passivo do imposto, ao mesmo tempo com os titulares do capital social e com todos os terceiros interessados na prestação de contas mercantis. Do que dissemos anteriormente resulta, por força do princípio de legalidade da tributação, que a relação que se estabelece entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil é uma questão que não pode ser deixada nas mãos de uma definição regulamentaria arbitraria ou de uma actuação discricionária por parte da administração tributária. A relação da qual nos ocupamos tem, pois, que ser estabelecida por lei, e além disto, em virtude da necessidade de certeza sem a qual o princípio de legalidade não se dá por satisfeito, tem que ser estabelecida mediante uma fórmula verbal dotada da precisão necessária para que poda considerar-se cumprido o requisito de uma definição legal dos elementos essenciais do pressuposto de facto tributário. No tem sido esta a situação legislativa existente em nenhum dos ordenamentos estudados se consideramos a maior parte da história da imposição sobre o rendimento do capital e, mesmo no momento actual, a situação legislativa vigente, na generalidade de estes ordenamentos, está longe de satisfazer os requisitos mencionados, com o rigor que a importância da questão exigiria. As leis tributárias nunca estabeleceram de modo claro e preciso, nenhum dos vários aspectos da relação entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil. Nunca definiram a extensão com que se operava uma recepção das normas de direito mercantil reguladoras da contabilidade, através de uma definição correcta e rigorosa das fontes de direito mercantil abrangidas por esta recepção; não se definiu com rigor, si as normas valorativas especiais que o direito fiscal foi desenvolvendo, por vezes numa posição de antinomia e em outras ocasiões inclusivamente de concurso com as normas mercantis, tinham o seu âmbito de aplicação estritamente limitado ao cálculo da base tributável, ou se, pelo contrário, uma aplicação dessas normas também na elaboração dos estados financeiros mercantis, era uma condição para que um balanço mercantil pudesse ser considerado "correcto", de forma a excluir a possibilidade de um procedimento de liquidação sintética ou objectiva da base tributável, com a consequente redução da segurança jurídica para a posição do contribuinte na relação tributária; não se definiu se o contribuinte, tendo em conta os fins específicos da obrigação contabilística mercantil, distintos dos fins específicos da obrigação contabilística no âmbito da relação tributária, tinha o direito de realizar valorações distintas, com a observância das normas aplicáveis, no quadro dessas duas obrigações. Compreende-se assim, que esta relação entre o direito tributário e a contabilidade mercantil, desde os primórdios da imposição sobre o rendimento, tenha constituído uma fonte de problemas na interpretação e na aplicação do direito, com repercussões gravemente lesivas dos direitos do contribuinte. Podemos dizer, de modo genérico, que estes problemas decorrem da dificuldade que o direito tem em definir o que seja lucro, dificuldade esta que, por sua vez, não é mais do que um reflexo particular da dificuldade que a ciência económica tem para definir rendimento – aplicado o conceito de rendimento, neste caso, ao rendimento do capital – ou para definir um conceito de rendimento suficientemente analítico para que o cálculo da do rendimento, para qualquer dos fins do direito, possa ser regulado mediante umas normas jurídicas suficientemente precisas e seguras. Deste modo, poder-se-á também dizer que, reduzido à sua expressão mais simples, o problema da determinação da base tributável nos impostos sobre o rendimento do capital não nada mais do que o problema da definição de um conceito jurídico de rendimento. As fundações de um conceito jurídico de rendimento têm que ser procuradas no direito mercantil, já que este foi o ramo do direito que primeiramente se ocupou da obrigação de prestação de contas e de uma quantificação do lucro. Com efeito, como melhor se verá através da descrição que faremos de um conjunto de ordenamentos no I Capítulo, no dobrar da primeira metade do séc. XIX, em praticamente todos os ordenamentos estudados já se encontrava estabelecida a obrigação de prestação de contas e, de modo mais o menos expresso, a de quantificar o lucro, por força da necessidade de medir os dividendos que pudessem ser distribuídos aos titulares do capital societário. Ao passo que uma tributação do rendimento baseada em métodos de determinação directa do rendimento a gravar, se é certo que foi sendo introduzida gradualmente a partir de finais do séc. XIX, só se generalizou já em pleno séc. XX. Era, portanto, natural e inevitável, que o direito fiscal, desde estes primórdios, fizesse repousar a determinação do lucro tributável sobre os mecanismos do direito mercantil, a respeito tanto dos aspectos materiais da elaboração das contas como dos aspectos da sua aprovação. Assim, o direito fiscal viria a estabelecer uma relação, simultaneamente, com as normas que regulam materialmente o balanço mercantil e com o balanço mercantil concreto aprovado pelos sócios. Todavia, usualmente e na generalidade dos ordenamentos, o próprio direito mercantil também não adopta uma definição acabada de lucro, se por uma definição acabada entendemos um conceito que ofereça um grau razoável de segurança jurídica, isto é, um conceito que os distintos intérpretes do direito, seja no âmbito de uma relação mercantil ou de uma relação tributária, munidos apenas da metodologia jurídica, possam aplicar de um modo razoavelmente uniforme. De facto, constatamos que a lei mercantil, nos distintos ordenamentos, além de estabelecer alguns princípios muito gerais sobre a quantificação do lucro, incide sobretudo na regulação do processo através do qual se aprovam e se publicitam as contas empresariais, de modo que os interessados mais directos disponham dos meios necessários para exercer um controlo sobre aquelas contas. Desta maneira, a aprovação das contas empresariais torna-se fundamentalmente um acto que se diria, de certa forma, quase contratual, indubitavelmente de carácter privatístico, através do qual se logra uma composição equitativa do conjunto dos interesses emergentes das distintas relações mercantis. Assim, o legislador mercantil como que renuncia a delimitar precisamente o conceito de lucro porque confia em que o jogo dos interesses privados garantirá que o balanço empresarial traduza a imagem "verdadeira e justa" da situação patrimonial da empresa. Neste contexto, os princípios jurídicos contabilísticos do direito mercantil formam umas balizas bastante largas dentro das quais se pode mover este processo inter partes de aprovação do balanço. Assim, por exemplo, a lei mercantil estabelece usualmente o princípio da conservação o integridade do capital social. Mas normalmente não fornece regras suficientemente precisas sobre o que se deverá qualificar como capital o sobre como medir o capital. Cai nesta margem de indefinição, por exemplo, todo o problema da valoração dos intangíveis; ou o problema da capitalização dos investimentos em investigação e desenvolvimento versus dedução dos mesmos investimentos como gastos correntes; ou, mais simplesmente, o problema da valoração das perdas de utilidade económica por parte dos elementos do activo imobilizado. Este carácter indeterminado dos critérios jurídicos de valoração no âmbito do direito mercantil não significa que o direito se desinteresse e prive de uma tutela jurídica as questões de valoração que se situem dentro deste campo de indeterminação. O legislador mercantil considera, sim, que para a resolução dos distintos casos concretos, deve estabelecer uma margem de livre apreciação que é deixada nas mãos de quem aplica o direito. No entanto, uma vez que esta livre apreciação, em virtude da natureza peculiar da matéria à qual se refere – a valoração financeira – requer a ajuda de conhecimentos científicos específicos da ciência financeira, o direito mercantil estabelece um mecanismo jurídico que possibilita a intervenção, no acto jurídico de prestação das contas societárias, de umas entidades – os contabilistas e os auditores de contas – detentores de um conhecimento técnico especializado no tema da quantificação do património empresarial. Os contabilistas e auditores desempenham, pois, no processo jurídico que conduz à aprovação do balanço mercantil, o papel de aplicar o direito, tomando decisões valorativas dentro de margens de indeterminação deixadas pela lei, mediante a aplicação de critérios provenientes da ciência financeira. Até um certo ponto, podemos compará-lo ao papel que têm os notários na concepção e formalização dos contratos e outros negócios jurídicos, que o direito vê como demasiado complexos para que as solas partes interessadas possam por si sós, regular adequadamente os seus interesses. Têm, como estes, um conhecimento especializado e encontram-se providos, além disso, de fé pública. Mas enquanto a elaboração de um contrato é uma actividade totalmente normativa, já a elaboração do balanço se, por um lado, é também um acto mediante o qual se realiza uma composição equitativa de um conjunto de interesses privados, por outro lado, está vinculada à finalidade jurídica de traduzir em números, com veracidade, uma realidade económica, o que faz com que a sua actividade seja também, em parte, de natureza especulativa. Ao contabilista ou auditor pede-se, por tanto, que exerça a sua actividade com uma imparcialidade e uma objectividade que estejam acima dos interesses das partes nas relações jurídicas nas quais que se insere a prestação de contas. Mas enquanto estas entidades dispõem dos conhecimentos técnicos necessários para realizar a tarefa que lhes é pedida e estão, inclusivamente, dotados de fé pública, tudo isto não é suficiente para garantir a imparcialidade e a correcção das suas declarações. Surge assim o terceiro elemento no qual assenta o esquema do direito mercantil para garantir a verdade na quantificação do património das empresas, e este é uma regulamentação da actividade dos contadores e auditores, o seja a definição de um conjunto de pautas valorativas que uniformizam os critérios nos qual são os contadores e os auditores baseiam as suas apreciações. Estes critérios, podemos dizer, realizam a "fixação de uma dimensão quantitativa para a delimitação" das normas de indeterminadas estabelecidas pelo direito mercantil. De tudo o que dissemos anteriormente, podemos concluir que o direito contabilístico mercantil tem duas características que são da máxima importância para a relação que se estabelece entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil. Uma é que esta regulação se caracteriza pela a presença de um largo número de normas com um alto grau de indeterminação; outra é que, para preencher a margem de livre apreciação que resulta da indeterminação da normas mercantis, o direito mercantil necessita de uns conhecimentos técnicos específicos da ciência financeira, e para esse efeito remete para a disciplina específica da actividade profissional dos contabilistas e auditores. Por seu turno, a regulação profissional contabilística é um fenómeno poliforme, o que o torna de difícil caracterização. Dentro dessa regulação existem normas que possuem a estrutura de princípios generais, a par de normas extremamente detalhadas. Existem verdadeiras normas jurídicas, a par de meras "recomendações". Perante esta situação normativa, a fim de salvar o princípio de imperatividad no qual assenta todo o sistema de regulação do balanço mercantil, o direito mercantil consagra, como um princípio fundamental director da actuação do confeccionador do balanço, o princípio da imagem verdadeira e justa que é, não obstante, o mais indeterminado de todos os conceitos jurídicos da regulação contabilística. O direito fiscal, ao fazer repousar a regulação do cálculo do rendimento tributável no direito contabilístico mercantil, realiza uma remissão normativa para todo esse complicado sistema de fontes de normas. Ora, se com a ajuda dos distintos mecanismos mencionados, o direito mercantil consegue realizar uma tutela relativamente eficaz dos interesses conexos com a prestação de contas mercantil, já no campo tributário, a generalidade da doutrina entende que os fins da tributação não podem alcançar uma realização satisfatória, si o legislador fiscal deixa àquele sistema de fontes a regulação da quantificação do rendimento tributável. São fundamentalmente de duas ordens os motivos avançados pela doutrina, para explicar a razão da inadequação do direito contabilístico mercantil aos fins da tributação. Segundo uma concepção amplamente difundida, o problema residiria nos diferentes fins que presidem à obrigação contabilística mercantil, e mais concretamente à obrigação de apresentar e demonstrar a quantificação do património e dos resultados, e à obrigação de quantificação do rendimento para efeitos fiscais. Embora resulte evidente que as duas obrigações têm finalidades distintas, também é certo que, nos dois casos, o balanço constitui unicamente um meio para alcançar aqueles fins e faltaria demonstrar que o mesmo balanço, preparado de acordo com as mesmas normas, não poderia satisfizer os fins de ambas as obrigações. A maior parte da doutrina prefere explicar a inadequação do direito contabilístico mercantil para a quantificação do rendimento tributável, a partir da inadequação das características próprias deste sistema normativo para satisfazer alguns dos princípios materiais de justiça tributária. O acentuado carácter de indeterminação das normas contabilísticas mercantis, violaria os princípios constitucionais de tipicidade, como expressão do princípio mais amplo de segurança jurídica, de igualdade na tributação – na medida em que se permitiria ao contribuinte decidir sobre a medida da sua capacidade económica - e de eficiência na tributação – na a medida em que a indeterminação das normas contabilísticas seria altamente propicia à elusão fiscal. A fim de solucionar estes problemas, o direito fiscal optou, em todos os ordenamentos estudados, por desenvolver uma regulação própria aplicável à quantificação do rendimento tributável. Mas fá-lo no quadro da remissão para o direito mercantil, o que implica que, para a quantificação do rendimento tributável, se disponha de dos corpos de normas formalmente separados, as normas formalmente inseridas no direito mercantil e as normas formalmente inseridas no direito tributário. Neste contexto, a quantificação da base tributável implica, por parte daquele que aplica o direito, a necessidade de definir a relação que se estabelece entre estes dois corpos de normas. Para uma concepção doutrinal, que tem que ser enquadrada num dado momento histórico, mas que teve uma ampla repercussão inclusivamente no plano legislativo em vários ordenamentos, as normas fiscais teriam uma função integradora da regulação mercantil, na a medida em que o seu objectivo seria transformar as normas indeterminadas do direito mercantil em normas precisas que oferecessem segurança jurídica. Esta concepção, atractiva na sua lógica formal, assentava na ideia – em si mesma uma fonte de complexos problemas - de que as normas valorativas do direito tributário se aplicariam, não só para a determinação do rendimento tributável, mas também para o próprio balanço mercantil. Observamos anteriormente que esta concepção deve ser considerada dentro de um determinado contexto histórico. Com efeito, se consideramos a relação existente entre o direito tributário e o direito mercantil (a propósito da questão específica da determinação do rendimento) numa perspectiva evolutiva, podemos distinguir uma primeira fase histórica, na qual o direito tributário ainda não tinha desenvolvido uma regulação própria para a valoração contabilística. Nesta fase, que podemos situar nos primeiros três a quatro decénios do sec. XX, vigorava em todos os ordenamentos estudados um sistema de balanço único, que devia ser elaborado de acordo com os princípios gerais de contabilidade e com os usos da contabilidade mercantil. Os amplos poderes conferidos à administração fiscal, no âmbito do procedimento de verificação, conduziriam a que, na realidade, os critérios fiscais se impusessem para a elaboração do balanço mercantil, que deveria servir de base ao cálculo da base tributável. A fase seguinte caracterizou-se pelo desenvolvimento de uma regulação fiscal sobre a quantificação do rendimento e, por sua vez, pela concepção de que esta regulação fiscal se aplicaria também, em geral, ao balanço mercantil. Esta concepção das normas fiscais como normas integradoras da regulação mercantil, explica a relação entre os dois sectores normativos, no pressuposto de que as normas fiscais são unicamente um desenvolvimento das normas mercantis. A referida concepção assenta, portanto, na premissa de que não existe uma antinomia material entre as normas mercantis e as normas fiscais. Não obstante, como resulta patente a partir da jurisprudência de alguns dos sistemas estudados, esta premissa não é verdadeira, já que as normas fiscais estão muitas vezes em contradição com os princípios valorativos do direito mercantil. Em Itália, os tribunais chegaram ao ponto de declarar a invalidade do balanço mercantil aprovado de acordo com as normas mercantis em numerosos casos. De facto, foi a falta de uma definição clara, por parte do legislador fiscal, das relações normativas entre a determinação do rendimento tributável e o balanço mercantil, desde que se consagrou formalmente uma conexão entre os dois actos jurídicos, o factor que provocou uma evolução dos dois sectores de regulação num sentido divergente. Originariamente, a conexão entre a determinação do rendimento tributável e o balanço mercantil estabeleceu-se num contexto de uma fraca regulação legislativa da contabilidade material. Além disso, a adesão do direito fiscal a um conceito de lucro oriundo do direito mercantil, baseado na teoria do balanço e no critério da competência económica, foi inicialmente recebida como uma conquista por parte dos interesses privados perante o fisco – ou do direito privado perante o direito tributário – já que significava, em aparência, uma submissão do procedimento de determinação da base tributável ao direito civil, "forma ancestral de protecção da liberdade e do património individuais". No entanto, uma conexão estabelecida em abstracto, entre a determinação do rendimento tributável e a contabilidade mercantil pode ser alcançada por duas vias, sendo, uma delas, aquela em a que as normas tributárias se adaptam ou deixam influenciar pelo direito mercantil, e outra, aquela em que o direito mercantil se submete às normas tributárias. Na falta de uma definição precisa das relações entre os dois sectores de regulação, as possibilidades de formas em que se pode exercer esta influencia recíproca são praticamente infinitas. Deste modo, o que sucedeu foi uma reacção defensiva por parte de cada um dos dois sectores do ordenamento perante o outro, reacção esta que originaria uma intensificação da regulação legal por parte dos dois sectores, o mercantil e o tributário, cada um tentando fortificar-se contra o segundo. Este fenómeno produziu efeitos positivos, como um aumento da segurança jurídica em alguns aspectos da valoração. O direito mercantil, pelo seu lado, levou a cabo um esforço de transformação de um conjunto de princípios não escritos e de usos em normas de carácter legal, o que implicou a construção de todo um sistema coerente de normas valorativas por parte da ciência financeira, e a supressão do sistema anterior, em boa medida assente no puro arbítrio e na ausência de verdadeiros critérios científicos. Um esforço correspondente foi desenvolvido pelo lado do direito fiscal, no sentido de consagrar legalmente um conjunto de critérios valorativos próprios que haviam começado por ser aplicados na prática administrativa. Num plano substantivo, não se pode afirmar que os dois sectores tenham divergido significativamente. Pelo contrário, observou-se uma tendência ao longo dos últimos lustres, na generalidade dos ordenamentos, para uma aproximação do direito tributário aos conceitos e princípios fundamentais que o direito mercantil utiliza para regular o balanço mercantil. Mas o direito mercantil desenvolveu uma regulação assente num princípio fundamental de livre apreciação por parte do redactor do balanço, que pode chegar ao ponto de impor o afastamento das normas valorativas legais nos casos nos que estas não se mostrem adequadas para traduzir a "verdade do balanço", enquanto o direito tributário desenvolveu uma regulação assente na estandardização dos juízos valorativos. A partir de um dado momento – que podemos situar, para a generalidade dos países, entre os anos sessenta e setenta – os mercantilistas começam a chamar a atenção para o facto de que, na realidade, as normas fiscais não podem considerar-se sempre como um desenvolvimento das normas mercantis, mas que, pelo contrário, em muitos casos se constata uma antinomia entre as duas classes de normas, gerando-se neste caso uma situação de conflito. Dentro do quadro dos princípios comuns sobre a interpretação e a aplicação das normas jurídicas, a situação solucionar-se-ia outorgando às normas fiscais o carácter de normas, já não integradoras, mas sim especiais, em relação ao direito mercantil. Esta é a concepção defendida na actualidade pela maior parte da doutrina, sobre a relação entre as normas fiscais e as normas mercantis. É igualmente a concepção que vemos impor-se progressivamente nas legislações dos diversos países, mas a evolução legislativa neste sentido tem sido lenta e difícil. Obviamente, a concepção das normas fiscais como normas especiais pressupõe a existência de um campo especial para a aplicação destas normas, ou, simetricamente, supõe a existência de um conjunto de situações às quais se aplicam as normas gerais. No entanto, o direito fiscal – sendo que este é um segundo aspecto da relação normativa entre a determinação do rendimento tributável e a contabilidade mercantil – estabelece o princípio do balanço único, isto é, o princípio de que o balanço que serve de base ao cálculo da base tributável é o próprio balanço mercantil. Este princípio pode não se encontrar – e de facto na maior parte dos casos não se encontra ou não se encontrou no passado – expresso na lei. Mas o direito fiscal, ao estabelecer um procedimento de estimação directa do rendimento tributável, prevê que este procedimento tome como base o balanço mercantil, unicamente quando o mesmo balanço se apresente "correctamente elaborado e conforme com as normas legais aplicáveis". Sempre que esta condição não se verifique, este facto preclude o direito do contribuinte à determinação directa e a administração passa a estar facultada para proceder a uma determinação sintética ou objectiva. Perante esta norma, e na falta de uma definição do carácter especial das normas fiscais, que defina com precisão o âmbito de aplicação das mesmas, a elaboração do balanço mercantil de acordo com o direito tributário aparece como uma condição prática, ainda que não normativa, para a aplicação do procedimento de determinação directa. Mais recentemente, o direito fiscal começou a dar uma consagração expressa ao princípio do balanço único, que mencionamos anteriormente. Em coerência com este princípio, a norma fiscal estabelece que determinadas valorações, sobretudo as mais favoráveis ao contribuinte, não podem ser admitidas no plano fiscal sem que tenham sido previamente incluídas no balanço mercantil. A consequência deste requisito legal, consistirá em que as normas fiscais se apliquem também, a final, ao balanço mercantil. Esta situação é a que se verifica na actualidade ou se verificou em todos os países estudados. Quando este efeito de "dependência inversa" se produz, o mesmo implica uma interferência do direito fiscal sobre a esfera das relações de direito privado do contribuinte, com a consequente restrição da sua liberdade de actuação. Vemos assim como a falta de unas normas jurídicas precisas, expressas mediante unas fórmulas verbais perfeitamente claras, que regulem a complexa relação entre a determinação do rendimento proveniente do capital, a efeitos de tributação, e a contabilidade mercantil, pode ser uma causa, e é-o em muitas ocasiones, de uma violação não só dos princípios materiais de justiça tributária, mas também de princípios constitucionais comuns, como o princípio de segurança jurídica ou o princípio de liberdade de actuação nas relações de direito privado. Sobre os problemas expostos cabe observar que, apesar das importantes diferencias que encontramos no plano das fórmulas concretas utilizadas nos diversos ordenamentos, que tais problemas têm a particularidade de se estender à generalidade dos países nos quais existe tributação do lucro empresarial, e isto tanto no que se refere aos países pertencentes ao sistema de common law, como aos que se agregam no subsistema romanístico. Esse facto fica a dever-se a que os distintos ordenamentos, no que respeita à determinação do lucro – talvez com uma maior intensidade que noutros sectores do Direito, por ser este um campo especialmente agreste para a ciência jurídica – evoluíram numa profunda interacção, em resultado da qual não só algumas soluções legislativas se foram reproduzindo, mas que também muitos dos erros e deficiências de uns sistemas se foram propagando aos restantes. Estas circunstancias determinaram que, na actualidade, nos problemas de interpretação e aplicação do direito que deixamos mencionados, seja possível encontrar um conjunto de aspectos estruturais comuns, e que por este motivo, seja possível e desejável fixar alguns conceitos com uma validade geral, que possam servir para a construção de uma teoria para a interpretação das disposições legais que em cada ordenamento se apresentam ao intérprete do direito. Por estes motivos, entendemos que seria útil começar a nossa indagação por realizar um estudo do tema no direito comparado. Elegemos para este efeito seis ordenamentos muito diversos, mas que mantêm entre si conexões muito estreitas. Consideramos que muitas das soluções que existem ou existiram em cada um dos referidos ordenamentos só podem ser plenamente compreendidas quando se descobrem as fontes de inspiração do legislador, e quantas vezes esta fonte se situa num debate doutrinal ou numa teoria que se desenvolveu noutro ordenamento. Além disso, a comparação entre os distintos ordenamentos permite situar as várias soluções que foram sendo adoptadas pelo legislador o pela jurisprudência no seu contexto histórico, e compreender que em muitas ocasiões estas soluções foram ditadas por condicionamentos externos à ciência do direito, como o desenvolvimento verificado no âmbito das teorias financeiras ou até na evolução do contexto das actividades económicas. O nosso estudo de direito comparado começa com uma descrição dos diversos ordenamentos. Para cada ordenamento, procuramos explicitar as normas jurídicas efectivamente vigentes, o que desde logo pressupõe levar a nossa indagação muito para além das simples disposições da lei. De facto, nesta problemática como em muitos outros campos do direito mas talvez aqui com uma especial notoriedade, as normas jurídicas só podem ser captadas na sua integridade se tivermos em conta todo um conjunto de aspectos conexos com a aplicação do direito. Entre estes aspectos destacam-se a jurisprudência e a própria doutrina, assim como a própria evolução legislativa que é quase sempre um reflexo das duas primeiras. A partir desta primeira descrição, podemos constatar que, apesar de que os problemas que se deparam, a propósito da interpretação e da aplicação do direito, são muito similares nos vários ordenamentos, as teorias que a ciência do direito propõe para explicar a relação normativa entre a determinação do lucro tributável e a contabilidade mercantil apresentam uma acentuada diversidade quanto aos conceitos que utilizam. Assim, a tarefa de comparar as normas existentes nos distintos ordenamentos resulta dificultada, pelo facto de não se dispor de uma linguagem comum, isto é, de uns conceitos gerais que se refiram àquelas normas e que, traduzindo as suas características essenciais, permitam agrupá-las o diferenciá-las, conforme o caso. Atentas estas razões, procuramos desenvolver, no segundo capítulo, fundamentos para uma teoria geral a propósito da relação que se estabelece entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil. Consideramos que esta teoria deve assentar em três grandes problemas. O primeiro refere-se ao modo como se regula materialmente o cálculo do rendimento a gravar. Fundamentalmente, analisamos o problema da recepção, por parte do direito mercantil, das normas contabilísticas mercantis. Fazemo-lo sempre a partir de um enfoque geral, isto é, comum a todos os ordenamentos, razão pela qual deixamos de parte problemas específicos do sistema de fontes de cada ordenamento como, por exemplo, o problema, amplamente tratado na doutrina espanhola, do valor jurídico das resoluções do Instituto de Contabilidade e Auditoria de Contas. Além disto, analisamos a delicada questão do papel das normas contabilísticas de carácter técnico, o mesmo é dizer enunciadas pela a doutrina financeira, para a interpretação e a aplicação do direito. O segundo grande problema por nós considerado estrutural nesta problemática é o que se refere à relevância que tem para o cálculo da base tributável, o balanço mercantil concreto. Como procuramos demonstrar, uma regulação da relação entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil que satisfaça os princípios materiais de justiça tributária, e concretamente de segurança jurídica, implica uma rigorosa separação deste aspecto, em relação à questão precedente. Este aspecto deve, por sua vez, ser dividido em duas importantes vertentes, que o legislador até à actualidade não conseguiu distinguir. São eles a vinculação do contribuinte às valorações que tenha realizado no seu balanço mercantil, e a vinculação da administração às mesmas valorações, no procedimento de verificação. Um terceiro problema é o que se refere à debatida questão da interferência das normas valorativas do direito fiscal na regulação ou na prática da elaboração do balanço mercantil. Este é o problema que tratamos no ponto quinto do segundo capítulo, sob o conceito de "dependência inversa". Finalmente, no ponto sexto do segundo capítulo, culminando a investigação levada a cabo ao longo do trabalho, realizamos uma síntese comparativa dos seis ordenamentos descritos no primeiro capítulo. Para esta síntese comparativa, começamos por demonstrar que as classificações tradicionais, baseadas no conceito de dependência, não fornecem um quadro conceptual operativo para uma distinção dos vários sistemas estudados. Um primeiro motivo da insuficiência da teoria da dependência, formulada nos termos descritos, para descrever e permitir realçar as diferenças entre os vários sistemas, reside no facto de que coloca um ênfase excessivo num aspecto procedimental, consistente em tomar o balanço mercantil como ponto de partida para o cálculo da base tributável, à qual se chega seguidamente mediante um mecanismo de correcção extracontabilística. Este aspecto procedimental, que existe na generalidade dos ordenamentos, resultou de uma prática administrativa, adoptada desde o início da tributação dos lucros empresariais, por razões de simplicidade. Mas nesta época, tanto nos ordenamentos continentais como nos ordenamentos anglo-americanos, não existia uma regulação do cálculo da base tributável formalmente separada da disciplina do balanço mercantil. Mesmo nos casos em que o legislador começou por adoptar o método de "caixa" (EEUU) ou o conceito de rendimento-acréscimo do direito mercantil, pudemos observar como esta divergência se manteve apenas por um curto período, pois o sistema, pressupondo a conservação de duas formas de quantificação do rendimento totalmente distintas, tornava-se demasiado oneroso, tanto para a administração como para os contribuintes, o que levou a uma recepção dos métodos e conceitos mercantis por parte do direito tributário. Neste contexto, o expedicente prático de calcular a base tributável a partir do balanço mercantil não apresentava dificuldades maiores. No entanto, a sitação que existe na actualidade é bastante distintas. Em praticamente todos os ordenamentos, o direito fiscal desenvolveu uma regulação específica que alcançou no momento actual uma apreciável densidade. Esta regulação específica não assenta num conceito de rendimento distinto, nos seus fundamentos, do que existe no direito mercantil. Pelo contrário, os conceitos de rendimento do direito mercantil e do direito fiscal são amplamente coincidentes. As normas valorativas especiais do direito fiscal têm como função principal, não a de fixar uns critérios distintos para chegar ao conceito de lucro, mas a de estabelecer uns limites quantitativos fixos e objectivos, dentro dos quais se pode mover o juízo valorativo discricional do redactor do balanço, com o único objectivo de aportar segurança e igualdade na quantificação da obrigação tributária. O que não significa que, em termos quantitativos, não seja possível uma divergência de magnitude apreciável, entre os valores que em abstracto podem resultar das normas fiscais em comparação com os valores que podem resultar das normas mercantis, uma vez que os limites fixados pelas normas fiscais podem implicar diferenças consideráveis em relação aos limites resultantes das normas mercantis. No contexto legislativo actual, o conceito de dependência, para que possa explicar as diferenças que existem entre os vários ordenamentos, tem que ser reformulado, precisamente para incidir sobre este ponto fundamental, que reside no modo pelo qual as normas valorativas especiais do direito fiscal devem ser aplicadas, em relação ao balanço mercantil concreto. Em termos genéricos, é necessário distinguir em primeiro lugar, se existe um princípio geral de dependência-prejudicialidade do cálculo da base tributável em relação ao balanço mercantil concreto. Mas, em segundo lugar, importa precisar os diferentes graus em que este princípio se encontra estabelecido. Assim, para manter o conceito de dependência como conceito fundamental para a distinção entre os diversos modos pelos quais se pode estabelecer a relação normativa entre a determinação da base tributável e a contabilidade mercantil, teremos que realizar algumas afinações do conceito. A primeira consistirá em que o conceito de dependência, com o sentido que interessa ao nosso propósito, e a "dependência-prejudicialidade", isto é, aquela espécie de conexão que implica que as valorações que se realizaram no balanço mercantil concreto se tornem vinculativas para o cálculo do lucro tributável. No entanto, ao aplicar este primeiro critério de distinção aos diversos ordenamentos estudados, constatamos que o princípio se encontra consagrado em praticamente todos estes ordenamentos. Com efeito, em nenhum dos sistemas estudados, o contribuinte dispõe de uma liberdade absoluta para realizar valorações diferentes no balanço mercantil e na determinação do lucro tributável. Na maioria das vezes, quando algum autor afirma que nos sistemas anglo-americanos o directo fiscal contempla a possibilidade de aplicar critérios de valoração distintos dos mercantis, a afirmação tem como referência as normas especiais, e dentro destas, em especial, as valorações que podem divergir das mercantis dentro de limites muito estritos. Na nossa opinião, se quiséssemos uma chave sociológica para compreender a razão pela qual, tradicionalmente, se consideram os sistemas anglo-americanos em contraposição com os sistemas continentais, esta ideia comum tem origem no facto de, normalmente, o sistema que se toma como base de comparação, ser o sistema francês. Este caracteriza-se por dois traços que não existem nos sistemas anglo-americanos, os quais são: i) uma ampla heterointegração da regulação do balanço mercantil por parte do direito fiscal; e ii) uma faixa ainda bastante larga de aplicação do mecanismo de dependência inversa, o que implica a aplicação de normas de carácter "favorável" está dependente de que as mesmas normas se apliquem também ao balanço mercantil. No entanto, ao estender aquela comparação a outros sistemas do conjunto dos ordenamentos, constatamos que aquelas características, na actualidade, encontram-se bastante atenuadas ou foram mesmo eliminadas. Assim, dentro dos denominados sistemas de dependência-prejudicialidade, teremos de distinguir diversos graus e diversas modalidades de dependência-prejudicialidade. Partindo, assim, da ideia de que em todos os modelos estudados, existe um princípio de dependência-prejudicialidade, devemos começar por enumerar as características que são comuns a todos estes sistemas. São elas: o A existência de princípios próprios da tributação do rendimento Uma primeira característica é a existência de unos princípios próprios dos impostos sobre o rendimento e de alguns princípios específicos da tributação do rendimento do capital, divergentes dos princípios que regem o direito mercantil. Exemplos deste tipo de princípios seriam os de igualdade tributária, segurança jurídica ou capacidade contributiva. Na realidade, este aspecto não representa uma característica particular de nenhum modelo normativo de relação entre a determinação do rendimento tributável e a contabilidade. Constitui, sim, um aspecto inevitável de qualquer sistema, já que a existêncai de uns princípios próprios da tributação do rendimento deriva da especificidade dos próprios fins da tributação e, consequentemente, do direito tributário. Assim, estes princípios próprios da tributação, devem ser considerados como uma concretização dos princípios gerais do direito tributário, em especial, dos princípios constitucionais de igualdade e segurança jurídica. o A existência de normas valorativas específicas Outra característica comum a todos os sistemas estudados é a existência, em conformidade com os princípios mencinados anteriormente, de umas normas valorativas do direito tributário, igualmente divergentes do direito mercantil. Neste tocante, uma diferença que se observa entre os sistemas anglo-americanos e os sistemas continentais, no que se refere às normas valorativas do direito tributário, é que no primeiro muitas das normas vigentes não são normas legais mas jurisprudenciais. Esta diferença, porém, não é mais do que um reflexo num campo particular de uma característica estrutural dos sistemas anglo-americanos, que é a proeminência que a jurisprudência tem nestes sistemas como fonte de direito. Não se trata, por conseguinte, de uma diferença relevante para a caracterização da relação que se estabelece entre a determinação da base tributável e o blanço mercantil. As normas valorativas próprias do direito fiscal desempenham, como vimos, várias funções. Em muitos casos, estas normas são divergentes das normas de direito mercantil, unicamente na medida em que fixam limites quantitativos rígidos para o juízo valorativo que o redactor do balanço deve realizar para a aplicação das normas mercantis, como sucede com os regimes de amortização do imobilizado. Noutros casos, a função destas normas é a de limitar o campo das valorações possíveis que podem resultar dos critérios mercantis, podendo por este motivo dizer-se que tais normas especiais resultam de uma concretização dos princípios de segurança jurídica, de igualdade e de eficiência na tributação. Outras vezes, trata-se de normas que estão mais directamente relacionadas com uma preocupação por parte do legislador fiscal de realizar uma medição correcta da capacidade contributiva. Estas normas servem para delimitar um determinado conceito de rendimento, que o legislador considera ser o que melhor representa a capacidade contributiva, como, por exemplo, quando a norma exclui do lucro tributável, os aumentos de valor resultantes de uma revalorização dos activos, ou ordena que na imputação temporal de custos e proveitos se o observe o critério da competência económica. Podemos incluir dentro de esta categoria de normas, todos os critérios conectados com o princípio de realização do rendimento elaborado pelo direito fiscal. Por exemplo, devem incluir-se nesta categoria as normas desenvolvidas pelos tribunais norte-americanos, como a regra de "todos os eventos" ou do "controlo de fundos". Finalmente, existe uma terceira classe de normas valorativas especiais no direito fiscal, que são as que estabelecem valorações consideradas normalmente de tipo subvencional, e cuja relação com os princípios gerais mencionados, é mais difícil de estabelecer. o Uma recepção formal do direito mercantil Uma terceira característica de todos os sistemas estudados é a existência de uma recepção, como regra geral, dos princípios e normas próprios da contabilidade mercantil. Mas também neste caso encontramos uma diferença estrutural, entre os sistemas anglo-americanos e os sistemas continentais, quanto à forma pela qual se opera esta recepção, diferença esta que pode ser interpretada erroneamente como uma diferença ao nível do próprio modelo de relação entre a determinação do lucro tributável e a contabilidade mercantil. Nos sistemas continentais, esta recepção do direito mercantil reconduz-se ao conceito de reenvio normativo, sendo portanto um instrumento de técnica legislativa perfeitamente conhecido e caracterizado. Já nos sistemas anglo-americanos, a recepção dos princípios contabilísticos mercantis, que a doutrina fiscalista designa como princípio de "tax conformity", não assume formalmente o perfil de um verdadeiro reenvio normativo. Uma vez mais, devemos considerar esta diferença no contexto das características estruturais de cada sistema. Nos países continentais, existe uma tradição de regulação jurídica da contabilidade, enquanto nos ordenamentos anglo-americanos existe uma tradição de regulação da mesma matéria por parte dos organismos representantes da classe profissional dos contabilistas e auditores de contas. Estas normas, comummente designadas como princípios correctos ou geralmente aceites, emanados em forma de declarações (statements) sobre o que constitui, num dado momento, a prática geralmente seguida ou considerada correcta, são normas extremamente detalhadas, razão pela qual constituem critérios de conduta bastante objectivos para a valoração de situações concretas, mas oferecem um grau de segurança menor que as normas contabilísticas do direito mercantil dos sistemas continentais, pois, ao contrário destas, não tão a natureza de normas jurídicas. A pesar de que esta falta de carácter de normas jurídicas não constituiría um impedimento definitivo para que o directo fiscal pudesse estabelecer um reenvio normativo em sentido técnico para os referidos princípios correctos ou geralmente aceites, na realidade o direito tributário, nos ordenamentos anglo-americanos, opta por não realizar um verdadeiro reenvio normativo para estes princípios. Estabelece, sim, uma presunção juris tantum de que um balanço mercantil elaborado de acordo com os princípios vertidos nos standards – isto é, os princípios correctos ou geralmente aceites – estão conformes com o princípio jurídico (que constitui, no entanto, um critério "falso", enquanto critério de valoração) da imagem "verdadeira e justa". Não obstante a diferença entre as duas técnicas legislativas, sem dúvida importante, não se poderá deixar de concluir que tanto nos ordenamentos continentais como nos ordenamentos anglo-americanos, o direito fiscal opera, mediante diferentes técnicas e com uns efeitos distintos, uma recepção das normas que regulam a contabilidade mercantil. Nos dois casos, no entanto, esta recepção está além do mais submetida a um princípio de prioridade do direito fiscal que não é mais, na realidade, do que uma consequência do carácter de lex specialis que as normas de direito fiscal, por força da norma geral remissiva, adquirem em relação às normas mercantis. o Conexão concreta Finalmente, em todos os sistemas que analisamos, a relação entre a determinação do lucro tributável e a contabilidade mercantil caracteriza-se pela existência de um princípio de conexão concreta, com o significado de uma relevância decisiva das valorações realizadas no balanço mercantil, para o cálculo da base tributável. Esta norma pode aparecer expressa ou pode encontrar-se implícita no sistema de normas jurídicas que regulam a determinação do lucro tributável. Uma vez mais, ainda que incorrendo no risco de uma repetição fastidiosa, devemos observar que a inexistência de uma norma expressa que consagre tal princípio num determinado ordenamento, como efectivamente sucede, por exemplo, no ordenamento britânico, não autoriza a conclusão de que o mesmo princípio não faz parte do direito positivo nesse ordenamento. Realmente, o princípio de conexão concreta aparece consagrado em termos precisos em muito poucos ordenamentos. O princípio está consagrado em termos precisos no ordenamento espanhol através do artigo 19.3 da Lei do Imposto sobre Sociedades, e no ordenamento italiano, no artigo 75 do testo único. Está consagrado, em termos que a doutrina alemã tem criticado incansavelmente, no §5 parágrafo 1 da Einkommensteuergesetz alemã. No direito francês, apesar de a doutrina francesa ver uma base legal para o princípio do balanço único no artigo 38 do Anexe III do Code General des Impôts, os contornos precisos do princípio têm sido objecto de uma elaboração jurisprudencial no contexto da teoria dos erros contabilísticos e das decisões de gestão, bem como da teoria da correlação simétrica dos balanços. No direito norte-americano, pode se considerar igualmente que este princípio tem uma base legal na secção 446 (b) do Revenue Code, mas o princípio foi definitivamente consagrado na prática administrativa e sancionado pela jurisprudência. Ainda que o princípio não se encontre expresso nem na legislação nem no direito jurisprudencial, a doutrina norte-americana dá conta de que o princípio de conexão concreta se aplica na prática e de que esta prática corresponde a uma convicção de obrigatoriedade por parte dos contribuintes. As quatro características que acabamos de mencionar são as características comuns a todos os ordenamentos estudados e nos quais vigora um sistema de conexão concreta. A pesar de que todas as características mencionadas desempenham um papel no funcionamento do modelo, é o último ponto o que realmente o distingue do modelo alternativo, de desconexão ou duplo balanço. -. As razões para esta uniformidade são de certo modo evidentes, pois decorrem dos fins e dos princípios fundamentais da tributação, como sejam a utilização da contabilidade mercantil como meio de prova da veracidade das valorações submetidas ao fisco e a consideração do lucro mercantil, grosso modu, como uma medida adequada da capacidade económica. No entanto, como observamos, também existem algumas diferenças entre os vários sistemas estudados, e estas diferenças, se não se situam no plano dos princípios fundamentais da tributação e não possuem, portanto, a relevância das características mencionadas anteriormente, têm também o seu valor no âmbito da nossa análise, na medida em que permitem ressaltar aspectos de técnica legislativa relacionados com o princípio de conexão concreta. Deixamos já mencionadas algumas das divergências de técnica legislativa que podemos encontrar entre os distintos sistemas, a propósito das diferenças estruturais existentes entre os ordenamentos anglo-americanos e os sistemas continentais. Devemos agora focalizar a nossa atenção sobre as divergências que possam existir entre os ordenamentos continentais. i) La heterointegración del derecho mercantil por parte del derecho fiscal Para seguir uma sequência correspondente à ordem cronológica da evolução do próprio princípio de conexão concreta, começaremos por referir a questão da heterointegração do direito mercantil por parte do direito fiscal. Este foi um fenómeno que se verificou em todos os ordenamentos continentais estudados, mas em diversos contextos. No ordenamento francês, no qual o direito mercantil se manteve numa postura de agnosticismo, a respeito das questões da valoração contabilística, até bastante mais tarde do que, por exemplo, sucedeu no direito alemão ou no direito italiano, a regulação dos aspectos materiais do balanço mercantil por parte do direito tributário consagrou-se como um aspecto estrutural do sistema das fontes de direito contabilístico. A tributação do rendimento deparou-se, assim, desde o seu alvor, com esta ausência de uma regulação legal da contabilidade material. Neste contexto, e por força da necessidade de certeza nas normas fiscais, o direito tributário desenvolveu uma disciplina legal da valoração contabilística. Assim, as normas do direito tributário, no ordenamento francês, integram materialmente o direito mercantil, segundo o entendimento unânime da doutrina e de acordo com uma concepção jurisprudencial não contestada. Noutros ordenamentos, como o alemão ou o italiano, a disciplina material do balanço desenvolveu-se desde cedo dentro do direito mercantil. A regulação fiscal, desenvolvida para responder às necessidades próprias da tributação, formou-se desde o seu início, numa situação de antinomia em relação ao direito mercantil. A aplicação da regulação fiscal ao balanço mercantil, nos casos em que se verificou, manifestou-se como um efeito não directamente desejado pelo legislador fiscal, mas como um reflexo indirecto da existência de um balanço único. Por um lado, as valorações realizadas no balanço mercantil eram prejudiciais para o cálculo da base tributável; por outro lado, a elaboração de um balanço mercantil conforme com as normas legais aplicáveis era uma condição para que a administração fiscal aceitasse o resultado constante do balanço; e finalmente, o direito fiscal fornecia critérios sobre o modo de calcular o resultado para fins fiscais, sem precisar se estes critérios tinham ou não um carácter especial em relação às normas mercantis. Nestes ordenamentos, pelas razões mencionadas e em virtude da antinomia gerada com as normas mercantis, a heterointegração da regulação mercantil por parte do direito fiscal constituiu uma fonte de problemas constantes na aplicação do direito, de tal forma que as situações de heterointegração têm vindo a ser gradualmente saneadas, mediante um ininterrupto aperfeiçoamento do mecanismo da aplicação extra-contabilística das normas fiscais. Em todos os ordenamentos continentais estudados, com excepção do francês, existe na actualidade uma separação clara entre os campos de aplicação e um princípio de não interferência recíproca entre o direito mercantil e o direito fiscal. ii) La dependencia inversa Diferente da mencionada heterointegração da regulação mercantil por parte do direito tributário, é o fenómeno da dependência inversa em sentido estrito, designação que reservamos para os casos nos quais o direito tributário estabelece normas de valoração que representam desvios ao conceito de lucro efectivo – normalmente estabelecidos como direitos de opção, isto é, como normas dispositivas – fazendo condicionando a sua utilização para efeitos fiscais a uma aplicação das mesmas valorações no balanço mercantil. Em termos mais sintéticos, poderemos também dizer que, neste sentido estrito, a dependência inversa significa a aplicação de um princípio de conexão concreta às normas valorativas do direito tributário que não têm como fim a determinação do lucro efectivo, mas sim subtrair à tributação ou diferir a submissão ao imposto de uma fracção do lucro efectivo, por razões de política fiscal. Algumas das considerações que elaboramos a respeito da heterointegração da regulação mercantil por parte do direito tributário têm aplicação também a propósito da dependência inversa. Com mais razão, estas normas geram uma antinomia com as normas mercantis, já que resultam contrárias aos princípios da determinação do resultado efectivo. Também a dependência inversa constituiu e continua a constituir uma fonte de problemas sérios na aplicação do direito. Alguns sistemas, como Espanha e Itália, praticamente suprimiram os casos de dependência inversa, enquanto se mantêm muitas situações de dependência inversa na Alemanha e em França.